segunda-feira, janeiro 08, 2007

O Dakar é um excelente ensaio sobre a insanidade humana. A ideia de criar a mais dura prova automobilística de todo-o-terreno nasceu muito adequadamente no deserto, em 1977, quando Thierry Sabine se viu perdido por entre as areias da Líbia, durante o rali Abidjan - Nice. Ele próprio viria a morrer numa das edições da prova, devido a um acidente de helicóptero. O rali mata, aliás, que se farta: desde a sua primeira edição, em 1978, morreram mais de 50 pessoas e só em 2005 registaram-se cinco óbitos directamente resultantes da competição, entre os quais uma menina senegalesa de cinco anos, atropelada por um concorrente. Na Fórmula 1, como na Nascar, na DTM ou no WRC, um evento que matasse assim já tinha sido, no mínimo, revisto ou muito simplesmente terminado. O Dakar não. Nem o arrepiante número de fatalidades, nem a imensidão dos desertos, nem as temperaturas escaldantes, nem a duração insustentável da prova, nem a desumanidade das etapas extensíssimas, nem os conflitos armados do Magrebe, nem os bandidos do deserto, nem o senso comum assustam esta gente temerária. Vão todos contentes a acelerar para o inferno. Vão despreocupados e ligeiros para dentro do pesadelo. Vão muito divertidos rumo ao suplício. À chegada restarão 40% deles, derrubados pela exaustão, mas à partida, ninguém quer saber. Vão-se embora como quem vai para a Costa da Caparica, cheios de pica. Há gente para tudo.