quinta-feira, abril 10, 2008

Do tempo perdido.

Tenho andado para aqui metido comigo e com os afazeres da escravidão que é a vida e infectado de infernos profissionais variadíssimos (o Diabo é prolixo de passatempos) e aflito em azáfamas múltiplas e, de todo em todo, inerte.
Tenho andado para aqui metido em enredos e labores e lavores e merdinhas que não interessam para nada, senão para castigar a paciência e tudo porque decidi que não podia continuar a trabalhar sózinho quando o que devo sempre fazer, para sanidade minha e do mundo do trabalho, é precisamente continuar aqui enfiado em casa a esgalhar comunicação a solo para clientes felizes. Não consigo ter clientes infelizes, por muito que isso doa à minha conta bancária. E não consigo aturar já pecadilhos que eu próprio cometi. Gostava que a geração abaixo fosse um bocadinho mais original nos desaires e um pouco menos efusiva nos sucessos. Até porque hoje em dia, em Portugal, ninguém é realmente bem sucedido. Tenho andado para aqui metido em porradas com gente que não sabe dar porrada nem levar porrada (o que é grave) porque é gente mais nova, que, basicamente, se está a cagar no assunto, seja ele qual for, e com toda a razão.
Tenho andado para aqui metido comigo e com o Proust, que é um frívolo filho da puta (180 páginas para o primeiro salão nos Guermantes é obra) e que cada vez me dá mais prazer. Prazer sexual, prazer religioso, prazer estético, prazer, prazer, prazer. Quanto mais chego ao fim do Tempo Perdido, mais recordo o antigo fracasso moderno de Sartre. Querendo virar Proust de pernas para o ar sem ter a necessária elegância e desprovido de despreocupação moral, o tristemente célebre estrábico mais não fez que enjoar o público para toda a eternidade (que é dele, sim senhor). A Náusea devia fazer o pino para ser outra vez literatura.
Tenho andado para aqui razoavelmente insatisfeito comigo por causa dos outros o que não é conveniente para mim nem para os outros e estou lentamente a tranformar-me num apetitoso exemplo clínico do meu filósofo favorito. Ao contrário do que nos lembra Max Stirner, esqueço-me frequentemente que só sou dono de mim e que ninguém mais é de mim dono e às vezes dá-me um vontade assassina de desistir de ser preocupado.
Tenho andado para aqui resignado até para com certos comentários que ainda me vão deixando neste blog crepuscular, comentários sobranceiros que me ensinam que a wikipedia não é um enciclopédia, que me ensinam a ética do link (maravilhoso princípio que falhou à razão pura de Kant) como se eu desconhecesse o científico maneirismo iluminista, como se eu andasse para aí a baixar direitos de autor, como se eu não tivesse a quarta classe que tive - não a do meu pai, que era para doutores - mas a minha e como se eu não tivesse ido à escola mais do que isso nem soubesse nada de nada. Estes meus parceiros de blogosfera dão-se ao trabalho de visitar e comentar um blog que é escrito pelo mais ignorante dos ingénuos do universo dos simples de espírito. Bravo, bravo e os meus agradecimentos pelo fornecimento da electricidade espiritual de que tanto pareço carecer.
Tenho andado para aqui metido em irritações e nevralgias por causa de pivots de telejornal, chefes de redacção, opinion makers, think tank boys, fiscalistas, constitucionalistas, grevistas, criativistas, filipe vieiristas e outros filhos do grande esgoto da infâmia como os senhores da OPEP, os párocos de Barak Obama, os xiitas do quarto mundo ou os homens que engravidam porque já foram mulheres um dia. Os homens que engravidam porque já foram mulheres um dia são obscenos como a ausência de Homero.
Tenho andado para aqui metido em silêncio no buraco dos dias e tenho-me embebedado de vez em quando, o que é bom quando Mozart toca, o que é bera quando oiço Bach.

É claro que escrevi isto só para me aliviar do stress de ter um blog vazio de conteúdo. Quando, caramba, tudo o que precisava de fazer era passar um youtube qualquer com um puto de 16 anos a ir ao cú da stora na sala de convívio do liceu de sempre em Portugal. É o que a televisão faz à hora de jantar, e quem sou eu?