Paul Davies .
Tintoretto . Criação dos Animais . 1551-52
Vivi quarenta e cinco anos, mais coisa menos coisa, como ateu. Considero que nos últimos cinco a dez o meu pensamento teológico divergiu para um agnosticismo transitório, porque desconfio bem que morrerei crente.
Porém, o crente tem necessitado historicamente de um elemento crucial de que sou e serei sempre despojado: a fé. É a fé que tem consistentemente oferecido ao crente a certeza da existência de Deus, apesar do cosmos diabólico em que vive mergulhado. Sem fé, é difícil conciliar a presença do mal com a omnipotência divina. É psicologicamente complicado permanecer fiel a um Deus que se ausenta, quando mais precisamos dele. Que é cego, quando se manifesta a injustiça e surdo a súplicas de redenção.
Este meu trânsito do ateísmo ao agnosticismo não se fez, claro, pela fé que me é impossível, mas muito porque vivo num momento da história em que, para acreditar na existência de Deus, ou pelo menos para não negar em absoluto essa possibilidade, a fé já não é necessária. A razão serve perfeitamente, agora. A irónica e dialéctica ideia aqui é que eu posso substituir facilmente a virtude da fé pela virtude da ciência. Sim, o espírito científico e racionalista que foi muito responsável pela agonia das religiões ocidentais nos últimos 3 séculos, está a fechar o seu ciclo epistemológico com concludentes argumentos em favor da existência de Deus.
Tenho escrito aqui no blog sobre este assunto (dois recentes exemplos aqui e aqui), mas geralmente a conversa reduz-se ao campo das Físicas. Porém, as disciplinas da Biologia e da Neurologia são capazes de ser, neste momento, mais eloquentes. Para além da ignorância em que vivemos ainda sobre matérias tão básicas como a natureza e topografia da consciência, a residência e constituição material da memória, a necessidade do sono e a composição físico-química dos sonhos, por exemplo, a ignorância fundamental é a da mecânica da criação. Como é que a vida surgiu no planeta Terra? Nenhum cientista ateu faz a mínima ideia. Até porque sabemos bem que o encadeamento proteico necessário ao DNA e à vida - num universo sem criador inteligente - é estatisticamente impossível. E como as máquinas de criação proteica são feitas de proteínas, sobra apenas o axioma equívoco do ovo de onde saiu a galinha que o pôs. E eis aquilo a que chamaria o Primeiro Argumento Biológico em Favor da Existência de Deus: a impossibilidade matemática da geração espontânea e aleatória de proteínas implica o seu desenho inteligente.
Para investigar sobre a validade deste Primeiro Argumento Biológico, ninguém melhor que J. Warner Wallace, detective da brigada de homicídios de La Miranda e professor de Apologia Cristã na Universidade da Califórnia. São 15 minutos que recomendo a qualquer ateu. Wallace é um orador brilhante e a ciência está extremamente bem explicadinha.
J. Warner Wallace . How the Origin of Life Points to the Existence of God
Mas a ideia de que a realidade observável de um universo sem transcendência é insuficiente para justificar toda a completude da existência não é válida apenas pela incapacidade da ciência em demonstrar o contrário. Podemos lá chegar pelos livros e pela sabedoria ancestral que neles foi gravada, por exemplo. Porque queremos saber o que estamos aqui a fazer e podemos aprender muito sobre esse assunto com a sabedoria acumulada de milénios. Ricardo Araújo Pereira, nesta breve e emocionante palestra, diz que ateus e crentes, cientistas e teólogos, humoristas e priores, todos partilhamos essa procura pelo significado da existência. E todos nos encontramos, no percurso dessa odisseisa, para além dos limites da realidade positivista, mesmo que em pontos diferentes do espaço-tempo.
Ricardo Araújo Pereira . Espiritualidade Sem Fé.
A esta tese chamaria Primeiro Argumento Psicológico em Favor da Existência de Deus: a inevitável senda pelo significado da existência coloca invariavelmente o ser humano num plano transcendental.