segunda-feira, outubro 26, 2020

Violência solar.

Os Everything Everything já andam por aí a bombar loucamente há dez anos, mas este é o primeiro disco que oiço deles. Em boa hora, seja como for, porque os rapazes têm a intensidade de uma supernova com um ataque de nervos e veia criativa para dar, trocar, comprar e vender. Impressionante. 

Everything Everything . Violent Sun

Um Giro português e espectacular.

Acabou o Giro: João Almeida alcança melhor lugar de sempre para Portugal

Ontem, numa das etapas mais espectaculares do Giro e de toda a época ciclista, que acabou com os líderes Jai Hindley e Tao Geoghengan a terminarem com o mesmo tempo na classificação geral, a um dia do fim da prova (!), João Almeida mostrou quem é, atacou e terminou em quarto, ganhando 34 segundos aos seus directos concorrentes para o pódio, Kelderman e Bilbao.
Hoje, no contra-relógio que concluiu este alucinante Giro d'Itália, e onde Geoghengan fez a Sun Web pagar caro o erro de não ter obrigado Hindley a apoiar Kelderman - o líder da equipa e natural favorito à vitória - o João fez quarto na etapa e terminoui quarto na geral, ganhando os segundos necessários para ultrapassar Bilbao, o que é um feito extraordinário para o jovem ciclista português.
Este foi um Giro de sonho para as cores pátrias, já que o enorme Ruben Guerreiro, um atleta que faz completa justiça ao seu nome, garantiu a vitória na montanha, sendo o primeiro português na história a ganhar esta categoria em qualquer uma das três grandes voltas.
Mas independentemente do comportamento brilhante dos nossos valentes compatriotas, recomendo a toda a gente e principalmente àqueles que partilham comigo a paixão pela modalidade, que vejam a penúltima etapa desta edição do Giro d'Italia . É que foi uma espécie de verso homérico, poça.

terça-feira, outubro 20, 2020

A discoteca da minha vida #71: "Black Market Music", Placebo

 

"It's your fault that God's in crisis"

Se a minha lista de discos fabulosos fosse minimamente justa, os Placebo já tinham subido ao palco no século XX, só que o objectivo desta humilde iniciativa não é a justiça, mas o egocentrismo, e o disco fundamental desta banda, no contexto da minha vidinha, é o terceiro: "Black Market Music", lançado no redondo ano de 2000.
Os Placebo configuram um género de fenómeno poltergeist, mas ao contrário: sendo que a intenção de Brian Molko é inevitavelmente a de assustar a audiência com uma visão do mundo e da existência humana que deixaria Jean Paul Sartre meio envergonhado, a verdade é que o resultado final, muito por culpa dos acordes de Stefan Olsdal, é contraditoriamente elevado e inspirador. Da cave berço de todos os pesadelos, somos rápida e energicamente transportados pelo elevador da glória ao terraço de todas as possibilidades. A música desta malta é só aparentemente um elogio da eutanásia. Quando os ouvimos melhor, quando entramos neste universo denso e difícil e picaresco, percebemos que afinal se trata de um processo de redenção. "Black Market Music" não foi feito para incentivar o suicida, foi feito para o convencer a permanecer vivo. Sim, a vida é fodida. Sim, vais ter que aprender a lidar com o sofrimento. Sim, vais aparecer com um olho negro na entrevista para o emprego mais importante da tua vida. Sim, vais levar com um valente par de cornos, ou dois. Sim, os teus pais isto e aquilo. Sim, às vezes dá a sensação que há qualquer coisa de profundamente errado contigo. Sim e ainda assim: continua. Passivo-agressivo, deprimido-coitado, desperdício ontológico na sarjeta do inferno. Continua. Até que os deuses te obriguem a devolver os átomos que pediste emprestado ao universo, pega numa guitarra e continua.
Placebo. Estes rapazes não são bem uma banda. São o diabo de um monumento ao rock.

segunda-feira, outubro 19, 2020

O herói improvável.

Na etapa de ontem, a mais difícil do Giro até ao momento, João Almeida perdeu tempo para o seu mais directo adversário, Wilco Kelderman, mas, ao conservar a liderança da prova num esforço solitário e hercúleo pela cruel subida de Piancavallo acima, deixando gente consagrada como Nibali e Majka e Bilbau para trás, provou em definitivo que é um voltista e que, nos próximos anos, vamos ter um português a bater-se com os melhores profissionais do circuito internacional de ciclismo. Se o João tivesse nem que fosse um só companheiro de equipa com ele nesta derradeira subida, as coisas teriam sido muito diferentes e eu estaria aqui a prever uma vitória portuguesa no Giro. Mas a Quick Step, sendo a equipa mais vitoriosa da primeira divisão do ciclismo mundial, não está programada para ganhar competições de 3 semanas e não trouxe escaladores que acompanhem a pedalada necessária, até porque ninguém esperava que o puto de 22 anos das Caldas da Rainha tivesse pernas e condição anímica para liderar a prova, à entrada para o seu último terço.

Seja como for, temos herói. Isso é garantido.
 

domingo, outubro 18, 2020

On Planet Dune #03


 

A discoteca da minha vida #70: "The Hour Of Bewilderbeast", Badly Drawn Boy

Setenta discos depois de ter aceite o convite do meu amigo Carlos Rafael, que apenas solicitava a eleição de dez, lá consegui chegar ao século XXI, nada mau.
E o primeiro longa duração deste século por acaso até é um daqueles que amo muito, muito especialmente: "The Hour Of Bewilderbeast", da inspirada autoria do Rapaz Mal Desenhado.
Há tanta coisa, há tantas músicas que adoro neste disco que nem sei como começar. Damon Michael Gough, aka Badly Drawn Boy, é o género de músico e compositor que nasceu para fornecer generosas doses de contentamento e consolação àqueles como eu, que gostam de canções bem dispostas, bem ritmadas, criadas para fazer as pazes com a vida enquanto testamos a agilidade das articulações, porque ninguém consegue ficar mal disposto, ou estático, enquanto ouve "Once Aroud The Block", por exemplo.
O disco, que por acaso até é o primeiro deste simpatiquíssimo autor, vale por uma embalagem extra-grande de Prozac. Vale por não sei quantas curas para a ressaca. E o bom do Damon há-de ter um lugar já reservado no paraíso, por ter feito, com a sua jovial veia, tanta gente feliz.

A discoteca da minha vida #69: "Jesus Life for Children Under 12 Inches", Kid Loco

Para acabar o século XX com um desabafo minimal e repetitivo: Kid Loco e o seu terceiro longa duração, "Jesus Life for Children Under 12 Inches". Porque sim. 

quarta-feira, outubro 14, 2020

Bach. Como deve ser tocado.

 
Xaver Varnus plays Toccata and Fugue in D minor on the great Sauer Organ of the Berliner Dom. Recorded live on the Opening Night of the "Berliner Internationaler Orgelsommer 2013".

terça-feira, outubro 13, 2020

Epitáfio

A minha vida são dois dias:
fui parido a tantos do tal,
serei enterrado no prazo normal.
Vivi a mais sinóptica das biografias,
história sem memória e voz sem audiência.
Nunca exerci poder ou trafiquei influência
e já dentro da idade foi a mediocridade
que me conservou a inocência.

Não fiz filhos por cautela
e evitei sarilhos como a febre amarela;
não sofri torturas nem conjurei vilanias.
A minha vida são dois dias
mas com uma noite apenas:
aquela em que cai cansado, enrolado enfim
no colchão das penas
que tenho de mim.

A minha vida são dois dias:
aquele em que fui nado,
aquele em que serei terminado.
Não provei doce glória ou exagerei alegrias
e às tragédias fui poupado.
Amei esporadicamente e esporadicamente fui amado;
dança de um só passo que no silêncio deste espaço
não há tango nem fado.

Deixo a mais sintética das biografias:
não fui senhor, não fui criado,
nasci em Portugal e em Portugal serei sepultado.
A minha vida são dois dias
de horas céleres e vazias;
nunca me aconteceu nada de especial,
foi discreto o meu astral
e morrerei de um qualquer mal.

A minha vida são dois dias
mas com uma noite apenas:
aquela em que adormeci ferido
na mais doce das arenas
e sonhei romano com o ser humano
que podia ter sido.

Que raça de coisa gira é esta?

O último disco dos Neighbourhood é de difícil entendimento para a inteligência dos ouvidos. Ainda não percebi bem se é um fracasso ou um triunfo. Tenho que ouvir mais vezes. Mas esta música aqui, que explica bem o carácter híbrido de "Chip Chrome And The Mono-Tones", mata-me completamente.



The Neighbourhood . Lost In Translation

A Scotland Yard como polícia política.

Numa entrevista à BBC, o youtuber Darren Grimes disse que  escravatura não é o mesmo que genocídio. Vai daí, a Scotland Yard abriu uma investigação sobre o rapaz, por alegada intenção de fomentar o ódio racial.

Podemos concordar com Grimes ou não. Eu por acaso não concordo. Concordo porém com o direito que ele tem de pensar assim ou assado e de dizer o que lhe apetecer. Ao direito que temos de pensar assim ou assado e de dizer o que nos apetecer chamamos livre arbítrio (ou liberdade de expressão, se quiserem). E o livre arbítrio é, em muitos casos, protegido constitucionalmente pela nações ocidentais.

O problema é que a constituição inglesa é consuetudinária (fundamenta-se no costume e não no formalismo de um documento escrito), o que sempre foi um ponto de honra para os bifes, enquanto o mundo vivia tempos normais. Como vivemos na mais absurda anormalidade, faz agora falta aos bifes um documento constitucional que proteja malucos como Darren Grimes. Porque chegarmos ao ponto em que a polícia abre investigações sobre cidadãos por causa da opinião que têm sobre isto ou aquilo parece-me, no mínimo e para não estar para aqui a irritar-me com as minha próprias palavras, preocupante.

Uma polícia que fiscaliza aquilo que as pessoas pensam e dizem é, necessariamente, uma polícia política. E só existem polícias políticas em estados totalitários. Logo, esta inacreditável decisão da Scotland Yard, que vem no seguimento de outras do género, coloca em questão a natureza do estado e do regime britânico.

Isto vai de mal a pior.

On Planet Dune #2











segunda-feira, outubro 12, 2020

A discoteca da minha vida #68: "Californication", Red Hot Chili Peppers

As vermelhas e quentes cabeças de piri-piri podiam ter constado desta lista há que tempos, claro. Acontece que o melhor disco desta épica e gigantesca banda, na minha opinião muito discutível, só acontece no último ano do século XX e depois de duas décadas de boas tentativas. "Californication" é o apogeu da discografia imensa dos Red Hot. Ponto final, parágrafo.

Da glória dos atletas à infâmia dos jornalistas.

João Almeida e Ruben Guerreiro lado a lado numa foto que fica para a  história - Fotogalerias - Jornal Record

Ontem aconteceu um fenómeno poltergeist, no Giro d'Italia. No cimo do Roccaraso, Ruben Guerreiro ultrapassou Castroviejo para ser o segundo português de sempre a ganhar uma etapa no Giro, somando à vitória os pontos que são suficientes para passar a ser o novo proprietário da camisola Azzurri (líder da montanha). Para ajudar à festa, o espectacular João Almeida, que como já tinha avisado aqui, é um ciclista com grande futuro e que está a fazer um Giro absolutamente fenomenal (já lidera a prova desde a terceira etapa) resistiu a mais um jornada de alto nível de dificuldade, perdendo uns poucos segundos para alguns dos favoritos, mas garantindo a camisola Rosa (e a Bianca também, porque é o melhor classificado entre os sub 23) por mais uns dias, e ainda com uma vantagem mais ou menos confortável, de 30 segundos, sobre o segundo classificado, Wilco Kelderman, e de 1 minuto sobre Vincenzo Nibali, o favorito entre os favoritos. E se considerarmos que a etapa mais decisiva da próxima semana será provavelmente o contrarrelógio, que pode favorecer o ciclista português, é bem possível que João Almeida chegue às altitudes alpinas da terceira semana do Giro com uma vantagem um pouquinho mais expressiva. A ver vamos. 

Seja como for, para quem gosta de ciclismo, o dia 11 de Outubro de 2020 vai ficar bem na gravado na memória como um dos episódios mais importantes da história do desporto nacional. E devo confessar que vivi momentos de intensa emoção e pura alegria. Primeiro com o Ruben, depois com o João. Numa etapa só. Que pinta.

Resta uma nota sobre a merda de jornalismo que temos: no site da Bola, não há um destaque para o que aconteceu ontem. No site do Record é para aí a sétima notícia. No Público, é a nona notícia na página de desporto, porque na homepage, nada. No Observador, a homepage destaca este dia inesquecível depois de cinco notícias sobre o miserável jogo de futebol entre Portugal e a França, que eu não vi mas tenho a certeza que foi miserável como são todos os jogos de futebol da selecção nacional desde que é comandada pelo homem-depressão, rei do empata, grão duque da mediocridade, carrasco de qualquer hipótese de espectáculo, mais conhecido por Fernando Santos.

No caso do Observador, sempre recordista da imbecilidade e da infâmia, o triunfo de Nadal no Roland Garros tem mais destaque do que aquele timidamente oferecido aos feitos dos dois portugueses.
Entre um mau jogo de futebol, que termina num empate sem golos, o rotineiro triunfo de um tenista espanhol (deve ser para aí a décima terceira vez que Nadal ganha este torneio) e a glória dos dois ciclistas portugueses, os jornais optam pelo absurdo.  

Mas seria de esperar outra coisa?

quarta-feira, outubro 07, 2020

A discoteca da minha vida #67: "Gran Turismo", The Cardigans

Ainda na senda do fabuloso ano de 1998, chamo ao palco uma das minhas bandas pop favoritas de sempre e para sempre: The Cardigans. Se a Suécia foi capaz de parir qualquer coisa de decente depois dos Abba, foram estes cinco magníficos. Nina Persson, a vocalista fatalista, nasceu com o rabiosque virado para a lua, nitidamente, porque, para além de ser um borracho de cair para o lado, e de se apresentar como competente escrevinhadora de rimas, é senhora de uma voz cujo poder imenso está entre o erotismo e o pudor, entre o desespero e o apogeu romântico, num festival lírico capaz de arrepiar os pelos da nuca a qualquer eunuco. Mais a mais, podia contar com uma orquestra de bolso à altura, liderada por Peter Svensson, músico completo, produtor, compositor e géniozinho discreto que se entretém hoje em dia a escrever canções para que certos artistas mainstream, que nem nomeio porque são meio obscenos, ganhem grammys com fartura. Os próprios The Cardigans ganharam 4 destes infames prémios, entre muitos outros infames prémios, o que constitui talvez o seu único defeito.
"Gran Turismo", o quarto dos 6 trabalhos de estúdio, é um daqueles discos encantados, abençoados por deus e lindíssimos por natureza, concebidos num máximo momento de inspiração e que vivem, por isso, para sempre. O que não é fácil, considerando que se trata de um trabalho de grande simplicidade, sem pretensões nenhumas nem gorduras de ambição desmedida. "Gran Turismo" é exactamente e apenas aquilo que quer ser: um descomprometido - mas eloquente - exercício de música popular.
E a prova da abismal competência dos The Cardigans é que podemos ouvi-los 22 anos depois sem correr o risco da decepção: continuam tão contemporâneos como eram. E elegantes como sempre foram.

On Planet Dune #1








A discoteca da minha vida #66: "The K&D Sessions", Kruder & Dorfmeister

No momento da história da música popular em que, como nunca, Berlim convivia com Buenos Aires, Londres com o Rio de Janeiro e Los Angeles com Bombaim, numa quase pornográfica salganhada globalista - archote do optimismo sem rédea desta década - os campeões do fenómeno, espécie de Dupont e Dupond do drum and bass, são dois austríacos: o rapaz Peter Kruder e o rapaz Richard Dorfmeister. Desde 93 que estavam a tentar substituir o chip do ouvido a muita gente, mas é com o seu quarto lp, "The K&D Sessions" que substituem definitivamente o meu. A partir daqui, passei a ouvir música de outra maneira. Ponto.
Os 21 temas desta obra de patinagem artística numa selva tropical constituem um cânone pós-moderno que noutras artes raras vezes encontrarás, porque o pós-modernismo é mais um movimento de destruição do que de invenção. Acontece que os Kruder & Dorfmeister conseguem fazer da destruição, uma invenção. Entre ressureições de temas pop, dissertações dub e viagens ao Brasil, "The K&D Sessions", de 1998, é um paraíso perdido. Como todos os paraísos.
Se está alguém desse lado que não conheça este disco, rogo que invista uns minutos de acuidade auditiva na versão genial de "Useless", dos Depeche Mode, que deixo em baixo. É, ou não é, um perfeito exercício de ritmo? É, ou não é, um sacana de um manifesto estético?
Kruder & Dorfmeister. Até o raio dos apelidos soam bem.

 

Nota: Como o Blogger tornou a edição vídeo num pesadelo, a apresentação da discoteca da minha vida teve que sofrer alterações e agora vai ser disco a disco, o que se calhar até é mais justo para os artistas.


sábado, outubro 03, 2020

Super fun steam speed.

Get woke, go broke: a queda da NBA.

"Republicans buy sneakers, too."
Michael Jordan

Se há fenómeno contemporâneo que me irrita loucamente, é o contágio entre a política e o entretenimento. Para além da histeria ideológica de Hollywood, da Netflix, da HBO, da Spotify e etc., o desporto foi também completamente contaminado com conteúdos políticos, que ainda por cima passam mascarados como verdades indiscutíveis e valores consagrados universalmente (como se todos tivéssemos que concordar com o movimento Black Lives Matter, por exemplo).

A NBA é talvez o exemplo máximo deste irritante e fraudulento fenómeno. Os multimilionários e super privilegiados profissionais da liga tentam desesperadamente passar por vítimas de racismo e de sexismo, amaldiçoando as virtudes da democracia que os enriqueceu e privilegiou enquanto pactuam desavergonhadamente com o totalitarismo do regime chinês (o dinheiro continua a poder mais que a ética, principalmente quando a ética é falsificada). Nos tempos que correm, é impossível vermos um jogo de basquetebol sem apelo à revolução. Os jogadores ajoelham-se durante o hino, em sinal de protesto contra sabe-se lá que ameaça terrível, usam camisolas com dizeres caricatos e frequentemente fundados em fantasias de extrema-esquerda, choram baba e ranho nas redes sociais de cada vez que a polícia prende ou mata um criminoso (desde que o criminoso seja negro, claro), cancelam jogos por não se sentirem seguros (como se eles próprios e a NBA não gastassem fortunas todos os dias em aparatos securitários que envergonham os serviços secretos destacados para a Casa Branca), enfim, a fantochada total levada ao máximo nível circense. E tudo isto entusiasticamente suportado pela própria organização da liga, que é mais papista que o papa e obriga os franchises a todo o tipo de iniciativas absurdas, desde a inserção no recinto de palavras de ordem que envergonhariam o Bloco de Esquerda, à imposição de normas linguísticas, o que corresponde, na prática, à censura de toda a opinião divergente da ortodoxia marxista barra justiceira social barra igualitária barra politicamente correcta. Para piorar um bocadinho mais este cenário orwelliano, os jornalistas e as estações televisivas que acompanham, relatam e transmitem a modalidade transformaram-se numa espécie de dois em um, dedicando-se afincadamente a misturar o comentário desportivo com o comentário político, sendo este último invariavelmente condicionado à opinião da liga e dos seus infelizes intérpretes. É muito possível, embora pareça impossível, ouvirmos um comentador da ESPN elogiar agora um afundanço de Lebron "Zedung" James e depois, como se a propósito, largar uma crítica à administração Trump.

Acontece que este movimento "woke" é descendente em termos de rentabilidade dos negócios. Há uma grande fatia da audiência que não está para ser aviltada por mensagens radicais, altamente divisivas e que nada têm a ver com o desporto. E o resultado está à vista: o primeiro jogo das finais da NBA deste ano foi o que teve a mais baixa audiência televisiva de sempre, na história da liga. Em relação às finais do ano passado, que também já tinham registado um gordo decréscimo, a queda foi de 44%. O jogo foi visto por sete milhões de pessoas, e se pensares, caro leitor, que sete milhões de pessoas é muita gente, posso-te dizer que há gamers no Youtube, como Pewdiepie, que têm maior audiência em cada vídeo que publicam. Nem é preciso dizer mais nada.

Este é o tipo de falência técnica que, num mundo normal, levaria as pessoas responsáveis pela liga a pensar duas vezes. Mas nada disso. Até que não reste pedra sobre pedra a NBA vai seguir este rumo autofágico. Muito simplesmente porque a destruição pela destruição é o sentido único, é o end game, da esquerda americana dos tempos que correm. No desporto, como em tudo o resto, interessa aniquilar o que fazia da América a América: os desportos profissionais, como a produção cinematográfica; a indústria automóvel, como a aero-espacial; a república federal, como a constituição; a história, como os seus grandes vultos. Só quando chegarem ao zero absoluto é que vão ficar felizes. 

Felizes entre as ruínas.

sexta-feira, outubro 02, 2020

The Epic Split ou a raridade de um bom spot publicitário.

Uma das indústrias mais afectadas pelo declínio criativo e artístico da civilização ocidental tem sido, inevitavelmente, a publicidade. É hoje muito raro vermos uma campanha decente ou um spot minimamente imaginativo. Eis uma excepção. E pelo que investiguei, o filme é realizado sem efeitos digitais nem truques escondidos que garantam a segurança de Jean Claude Van Damme. Além disso, o que se vende aqui é o produto, objectivamente (a precisão direccional da nova gama de pesados da Volvo). A ideia é muito boa, mas não abdica de servir perfeitamente o objectivo comercial da marca. É para isso que serve a publicidade e o marketing, afinal. Porque o que muitas vezes acontece é que nos lembramos de uma campanha, mas esquecemos rapidamente que produto pretende vender. E isso, não é publicidade. Isso é deitar dinheiro à rua.