quinta-feira, janeiro 31, 2019

Jornal de Letras - 2016/2018 - #02

As 48 Leis do Poder . Robert Greene e Jost Elfers . Escolar Editora
Este livro lindíssimo, com um trabalho de tipografia notável, foi-me oferecido por um querido amigo e devorado num instante. São 3000 anos da história do poder em 500 belas páginas de erudição, pragmatismo e boa ciência política. Leis como "finja ser amigo, aja como espião" ou como "despreze o que vier de graça" parecem cínicas e excessivamente draconianas, mas estão todas muito bem fundamentadas pela lógica, pela história e por um anedotário que é eloquente e muito divertido.
Uma edição de luxo de uma pequena editora cuja leitura recomendo vivamente.

Purity . Jonathan Franzen . D. Quixote
Este romance de Jonhnatan Frazen é tão fraquinho e desinteressante que ilustra bem o meu pessimismo em relação à ficção contemporânea. Leio cada vez menos romances porque os rmances que se escrevem hoje em dia são, em 95% dos casos, como este aqui: dispensáveis.

Conde Belissário . Robert Graves . Estúdios Cor
A propósito de novelas contemporâneas que não prestam para nada, eis um maravilhoso romance histórico publicado em 1938 de um grande romancista, poeta e ensaísta irlandês, autor crónico de  obras primas de que o célebre "Eu, Cláudio" será o melhor exemplo. O livro, que descobri recentemente na cave a ganhar bolor, conta a história do General Belissário, lendário conquistador do império romano do oriente e súbdito do imperador bizantino Justiniano. Trata-se de excelente literatura e a excelente literatura tem, pelo menos, uma coisa boa: dá um enorme prazer ao leitor.

A Cartuxa de Parma . Stendhal . Estúdios Cor
Apesar de ser um apaixonado por "O Vermelho e o Negro", que já li 3 vezes, nunca até aqui tinha lido esta outra obra prima de Stendhal. Por uma razão ou por outra, não me deu este clássico tanto prazer como o outro. Mas a história de amor e traição protagonizada por Fabricio del Dongo e Sanseverina não deixa de ser arrebatadora. Stendhal não sabia fazer nada que não fosse grande literatura.

Stoner . John Williams. D. Quixote
Esta novela aqui, que segundo o New Yorker é "o melhor romance americano de que nunca ouvimos falar", foi originalmente publicada em 1965, mas só agora está a ser mais publicada e conhecida. Vá-se lá saber porquê: trata-se de um belo, embora soturno, manifesto existencialista que retrata a vida de um obscuro professor de literatura do midwest americano. Gostei imenso, por acaso.

Quinhentos Poemas Chineses . Coordenação de António Graça de Abreu e Carlos Morais José . Vega
A propósito desta livro, já postei aqui no blog algumas notas. Vale a pena dizer que esta edição da Vega foi importante para a minha descoberta da poesia chinesa, que deveras aprecio. Isto apesar de ninguém que não domina a língua dos mandarins poder realmente compreender a sua literatura. Qualquer tradução para português será sempre uma versão e não uma tradução, porque os chineses não têm alfabeto, mas sim uma escrita fundada em ícones (lologramas) que podem encerrar vários vocábulos e vários significados. Além disso, um poeta do período clássico chinês teria também que ser um mestre das artes gráficas, sendo que a componente visual dos poemas chineses, que também cumpre uma espécie de métrica, não tem expressão possível nos idiomas ocidentais. Voltarei a este assunto quando falar de um livro de poemas do grande Li Bai, que estou a ler agora.
Seja como for, quem gosta de poesia deve comprar este livro e lê-lo. Abre-se aqui uma janela para a infindável beleza da literatura oriental.

12 rules For Life - An Antidote to Chaos . Jordan B. Peterson . Allen Lane
Como não tive paciência para esperar pela edição portuguesa, mandei vir a versão original deste brilhante manual de sobrevivência, cuja recensão nã é necessária, já que tenho escrito, nos últimos meses, bastante sobre este livro. Se calhar o texto mais pertinente dos que postei, é este aqui, que foi escrito a propósito da visita do mestre a Portugal, precisamente com o objectivo de lançar este livro.

O império Imóvel ou o Choque dos Mundos . Alain Peyrefite . Gradiva
Um calhamaço de história como deve ser, esta odisseia da primeira embaixada britânica no Império do Meio é absolutamente fascinante. É a história de um fracasso tremendo, claro. Ingleses e chineses recusam entender-se. Esforçam-se até por se desentenderem. Do protocolo à geo-estratégia, há um mundo que os divide. O livro está magnificamente escrito, é extremamente fiel às fontes históricas e leva-nos por um percurso rocambolesco de equívocos e glórias, cumprido por homens que nem sempre tinham consciência do que estava em causa, mas que tinham claras ideias de dever, de honra e de sentido de estado. Homens que já não encontramos hoje. Histórias que já não acontecem.
Este livro de Peyrefite fica para mim como uma obra de referência, no contexto da disciplina da História. Mas também como uma lição de vida: os chineses recusaram as pretensões do esforço diplomático dos ingleses porque não conseguiram simplesmente imaginar que uma nação bárbara e tão mais insignificante na escala geográfica, demográfica e ontológica das coisas, pudesse realmente representar uma ameaça. Décadas mais tarde, aprenderam não pela diplomacia, mas pela eficácia dos canhões, que um império imóvel não tem grandeza. E foram humilhados por uma só frota britânica. Desse erro, velho de 230 anos, só agora estão a recuperar.

quarta-feira, janeiro 30, 2019

Clássicos de culto: o Citroën DS Pallas de 1968.

Este objecto de ficção científica aqui, desenhado num momento de grande inspiração pelo senhor Bertoni, é mais que um automóvel: é uma afirmação da criatividade e do engenho humanos. Dos faróis direccionais à lendária suspensão hidráulica, tudo neste carro grita por um futuro utópico, um futuro em que a inovação tecnológica e a elegância, o conforto e o bom gosto, a funcionalidade e sofisticação servem o destino do homem.

Jay Leno tem um destes maravilhosos automóveis, na sua célebre garagem. E este vídeo descreve o DS - e ilustra a sua glória - muito melhor do que eu posso ou sei fazer.


Características técnicas aqui.

terça-feira, janeiro 29, 2019

De volta ao mistério.

Nestes deliciosos 11 minutos (exurb1a é um dos mais inspirados e eruditos e divertidos youtubers da web), explica-se tudo o que a Física sabe e tudo o que não sabe, para se chegar à conclusão que a ignorância é incomparavelmente superior à sabedoria. E assim, regressamos ao mistério. Ou a uma ideia de Deus.

segunda-feira, janeiro 28, 2019

Manifesto Anti-Ba

A esta Terceira República não faltam vilões e gatunos,
nem escasseiam imbecis entre bárbaros e hunos;
É verdade que há gente torpe que vibra em vários acordes,
mas o Mamadou Ba bate todos os recordes.

O Mamadou é o Dantas ao contrário: até vestido é horroroso!
E a Assembleia ainda lhe paga por ser assim mentiroso!

Quando for grande, o Momadou quer ser Idi Amin Dada.
Morra o Mamadou, morra, Ba!

Portugal é uma nação modesta, sem virtude que se veja:
precisa do Mamadou como um bolo de merda precisa da cereja.
Para o Babadou ser marxista, o contribuinte paga a franquia:
pregador em Lisboa, saca uns cobres à autarquia.

A retórica do Mamadou tem dois séculos de formol!
Se o Mamadou é português, quero ser espanhol!

E se é senegalês, que seja cortês e volte p'ra lá;
Morra o Mamadou, morra, Ba!

Estudou letras em Dakar mas é ignorante de história:
os brancos carregam no seu fardo mais que a vil glória
do comércio negreiro e do colonialismo soez
(a faculdade do Mamadou foi levantada por um francês).

Em cada ser humano, Mamadou descobre o preconceito.
É o dono moral da democracia e nem precisa de ser eleito!

O Mamadou é um artista, bruto niilista ao deus dará,
Morra o Mamadou, morra, Ba!

Se correr com um milhão de portugueses todos os anos
O Mamadou fica como quer: num Portugal só de angolanos.
Entretanto grita e protesta, irrita e molesta com o SOS alarmista,
quando ele é, entre todos os klans, o palerma mais racista.

O Mamadou compara a polícia ao excremento animal
e depois exige por direito a protecção policial!

Quando for grande, o Momadou quer ser Idi Amin Dada.
Morra o Mamadou, morra, Ba!

O Mamadou é esperto como um rato, como um rato é belo
e ainda vai ser condecorado pelo Marcelo!

Se é senegalês, que seja cortês e volte p'ra lá;
Morra o Mamadou, morra, Ba!

O que o Mamadou sabe, já a República devia ter esquecido!
O Mamadou é o Dantas ao contrário: horroroso até vestido!

O Mamadou é um artista, bruto niilista ao deus dará,
Morra o Mamadou, morra, Ba!

Jornal de Letras - 2016/2018 - #01

Já há tanto tempo que não respeito a rotina de deixar, aqui no blog, registo das minhas leituras, que tenho uma pilha enorme de livros na secretária, à espera de serem cadastrados e depois arrumados na estante.  Como a pilha está a ficar periclitante, vou ter que despachar isto de forma telegráfica antes que os tomos me caiam em cima da cabeça. E por partes, porque são muitos livros. Vamos a isso.

Em Busca do Tempo Perdido . Marcel Proust . Volumes I a IV . Relógio d'Água 
A leitura da tradução que Pedro Tamen fez da obra eterna de Proust vai demorar mais tempo do que eu imaginava (já estou a ler isto desde 2005). Vai durar todo o tempo do mundo. E mais não digo porque sobre estes livros sempre vou deixando, de uma maneira ou de outra, notas de leitura aqui no blog.

Obras Completas . Jorge Luis Borges . Volumes I a III (1923 - 1985) . Editorial Teorema
Apesar de também se tratar de uma obra sem fim, literalmente sem fim, a sua leitura tem sido substancialmente mais rápida (estou a ler desde 2014). É claro que já tinha lido muita coisa deste deus da literatura antes de adquirir estas "Completas", mas Borges é Borges e vale sempre a pena reler. Também neste caso, o melhor é remeter para o que tenho escrito sobre o bibliotecário de Buenos Aires aqui no blog.

O Tango . Jorge Luis Borges . Quetzal
Muito a propósito, o meu querido amigo José Aguiar ofereceu-me este magnífico conjunto de quatro conferências que, curiosamente, perfazem uns bocados de literatura que não estão integrados nas "Obras Completas". Um detalhe muito saboroso desta feliz edição é o de captar com rigor a oralidade do velho mestre, a sua espontânea erudição, o processo alquímico do seu discurso, que é o mesmo que dizer, do seu pensamento. O assunto das conferências, por acaso, não é daqueles que mais me interessam no imaginário do autor, mas, outra vez, Borges é Borges e ler Borges - ou no caso, ouvi-lo - é uma das coisas realmente maravilhosas que a vida tem para oferecer.

Enciclopédia da História Universal . As Reincarnações de Pitágoras . Arquivos de Dresner . Mil Anos de Esquecimento . Biblioteca de Brasov . Afonso Cruz . Alfaguara
"Os monges bibliofitas não dizem que fecham um livro. A expressão usada para este gesto é 'apagar a luz'."
Por falar em Borges, o projecto labiríntico do genial Afonso cruz continua a bombardear os meus dias. Aos dois volumes que já registei em duas anteriores entradas da rubrica Jornal de Letras, somei a leitura destes quatro em titulo. Não sei, sinceramente, onde é que o Afonso vai buscar a imaginação para esta aventura híbrida entre a realidade e a fantasia, entre os vivos e os mortos, entre a improvisação do passado e a história do futuro. Rendo-me simplesmente ao talento enorme e tiro prazer incontável das páginas desta enciclopédia.

Amok . Stefan Zweig . Relógio d'Água
A história de um médico vítima de Amok, expressão indonésia que significa "lançar-se furiosamente na batalha" e que curiosamente faz parte do universo idiomático português ("deu-lhe um amok"). Apesar de tudo, trata-se de uma história de amor, contada por um dos mais atípicos novelistas alemâes da primeira metade do século XX. A novela não é de fácil digestão, apesar de ser breve, mas tem uma ambição clara e meritória: a descida vertiginosa às profundezas da alma humana.

Os Escritores Também Têm Coisas a Dizer . Carlos Vaz Marques . Tinta da China
Tenho sentimentos antípodas sobre Carlos Vaz Marques. Todo o meu ser se fecha na certeza de que se trata de um imbecil de primeira água, mas depois analiso o percurso e os projectos do sujeito, da direcção da revista Granta à moderação do Governo Sombra, e sinto claramente que devo refrear a velocidade dos meus instintos, porque alguma coisa de decente o tipo deve ter. Este livro de entrevistas, porém, encoraja-me a má língua. Carlos Vaz Marques entrevista uma dúzia de autores de língua portuguesa, de Saramago a Dulce Maria Cardoso, só para revelar que os meus instintos estão certos: se o entrevistador é um imbecil rematado, não há entrevistado que sobreviva. Um livro sofrível (até o título é bera) e ponto final.

Fisiologia do Gosto . Brillat-Savarin . Relógio d'Água
Advogado, juiz, presidente da Câmara de Belley, deputado girondino durante a primeira fase da Revolução Francesa, violinista virtuoso e afamado comensal, Brillat-Savarin deixou para a posteridade este livrinho que pretende dissecar cientificamente a cultura gastronómica humana. É um projecto pomposo, mas falhado e aborrecido, por muito que Roland Barthes, na introdução, tente salvar a coisa. Vale a pena, talvez e apenas, pela linguagem pseudo-científica do século XVIII, que dá vontade de rir.

I Think You're Totally Wrong . David Shields and Caleb Powell . Penguin Random House
Dois amigos, um pragmático e outro intelectual, decidem tirar uns dias de férias para se enfiarem numa cabana em nenhures de forma a terem total disponibilidade para discutirem sobre política, arte, religião, sexo e outras coisas assim disruptivas. Como a ideia fundamental é a do prazer da discórdia, o resultado é este divertido e dialéctico livrinho, carregado de um certo tipo caótico de inteligência, mas também de tolerância (não a tolerância de plástico que está em voga, mas a outra, que é própria dos espadachins). Nos dias que correm, em que é cada vez mais difícil manter a civilidade sobre as divergências, esta é uma edição deveras pedagógica.
Deste livro saiu um filme (ainda não vi). Eis o trailer:


domingo, janeiro 27, 2019

Walter White ou a banalidade do mal.


A moralidade do protagonista de Breaking Bad é dissecada por Jordan B. Peterson, numa das suas célebres aulas na Universidade de Toronto. A conversa oscila entre o holocausto nazi e a odisseia de Pinóquio, mas não te preocupes, gentil audiente, que são dez minutos carregados de lucidez. Peterson concorda com Hannah Arendt: dadas certas condições, pessoas normais são capazes de actos horríveis. E isso é que é verdadeiramente preocupante na condição humana: não precisamos de vilões para que se cometam as mais inimagináveis vilanias.


sexta-feira, janeiro 25, 2019

O vocalista está engripado,

mas os Wild Nothing continuam de saúde. Uma banda que sigo desde 2010 e que traz sempre inspiração e sensibilidade aos meus dias. O último disquinho, Indigo, está muitíssimo bem.



Wild Nothing . Letting Go. Live on KEXP

O critério Twitter.

Enquanto um utilizador clama pela identificação e posterior chacina dos alunos de Covington, e o Twitter nada faz, Lindsay Shepherd vê a sua conta suspensa por denunciar um travesti que se entretém a fazer perguntas a raparigas adolescentes sobre a utilização de tampões.
Extraordinário critério.

quarta-feira, janeiro 23, 2019

Voltei a ser júnior.

Há uma primeira vez para tudo e esta aqui é a primeira vez que editei vídeo. Nos tempos que correm, um gajo que trabalha em comunicação tem que saber fazer isto. Mesmo um gajo que tem 30 anos de profissão, porque nunca é tarde para aprender, embora incomode um bocado voltar ao estatuto de júnior.
Não está nada do outro mundo, claro, é uma edição linear só de texto e imagem fotográfica, mas serviu o cliente. Vou continuar a aprender e a melhorar. Talvez um dia possa postar aqui um filme como deve ser, editado por mim.


Pela Estrada Fora #16

Ando à deriva pela N1. Sem destino nem pressa de chegar. Sinto-me realmente livre. Realmente dono de mim. Tenho tempo de sobra, estrada aberta, o depósito cheio, o céu azul, os Young The Giant a tocar na estereofonia e a disponibilidade de 230 cavalos. Um dia perfeito não precisa de muito mais.






Uma espécie de punk rock.

Tokyo Police Club. Uma banda que é prima dos meus queridos Piggeon Detectives, e que traz um cheirinho de punk rock a este muito necessitado século XXI. Boa onda.



Tokyo Police Club . Simple Dude

terça-feira, janeiro 22, 2019

Do Buzzfeed ao Observador: jornais, mentiras e vídeo.



As fake news e os histerismos das redes sociais, com a cumplicidade das grandes empresas de media e das tecnologias da informação (que são hoje uma e a mesma coisa) estão a criar um totalitarismo meio estranho que se funda na mentira e tem uma agenda sinistra - a da polícia do pensamento. O que se passou nos últimos dias com a Buzzfeed e com os alunos de Covington é, neste contexto, paradigmático.

No primeiro caso, a notícia que afirmava que Trump tinha ordenado ao seu advogado que mentisse na comissão de inquérito do Congresso foi desmentida pelo próprio Special Counsel de Muller, que investiga o Presidente, deixando 90% dos media, que passaram as 12 horas do loop diário a especular sobre a questão, num embaraço sem nome.

No segundo caso, o spin dado ao breve vídeo que capta o face a face entre uma turma de alunos de um colégio católico, que envergavam bonés MAGA (pró-Trump), e um grupo de activistas índios, liderados por um velho percussionista, é completamente contrário ao que de facto se passou e ignora até os verdadeiros responsáveis pela confusão: um grupo extremista que luta pela supremacia negra, sugestivamente chamado Black Hebrew Israelites (são os tipos simpáticos na foto em cima), cujas provocações grosseiras e profundamente fascistóides não interessam nem preocupam a turba do Twitter e os justiceiros da CNN.

As duas situações são vergonhosas, mas a forma extrema como os miúdos de Covington foram tratados nas redes sociais, com ameaças de morte vindas de todo o lado e críticas violentas até de jornais conservadores americanos como o National Review, é verdadeiramente assustadora - e um sério aviso à navegação.

O programa de ontem de Tucker Carlson explica bem o que se passou e analisa ainda melhor porque é que aquilo que se passou é grave.



O Observador, respeitando a sua lamentável deriva à esquerda e um critério de rigor que se aproxima perigosamente de zero, publicou ontem uma notícia sobre o caso dos adolescentes de Covington que é completamente falsa. Hoje retirou essa infâmia do feed e publicou outra notícia que está mais próxima da verdade, mas que continua a teimar na maior parte dos erros de ontem. Quando toda a gente já sabe que o que foi publicado ontem é falso. Incrível.

Neste contexto, e de forma a que o jornal de que é publisher mantenha uma relação um pouco mais honesta com os seus leitores, proponho um slogan ao José Manuel Fernandes:

Observador: todos os dias um pouco mais à esquerda.
Uma publicação do grupo CNN 

sábado, janeiro 19, 2019

Clássicos de culto: o Golf MK1 GTI de 1975.

Muito a contragosto, e com cautelas várias, a Volkswagen lançou na feira de Frankfurt de 1975 aquele que é o primeiro dos Hot Hatchbacks da história da indústria automóvel. Debitando 108 cavalos e pesando apenas 810 quilos, este é o santo graal dos grande turismos para o operariado. A partir daqui, qualquer pessoa com um ordenado de classe média passou a poder conduzir uma máquina dos diabos. E a utilizar essa máquina para levar os filhos à escola ou os cavalos ao autódromo. Este conceito do Golf GTI sobreviveu até aos tempos de hoje. Eu sou o feliz proprietário de um MK7 que respeita o mesmo civilizado princípio: um carro que anda à brava, mas que podes utilizar como um utilitário normal.
Para além de tudo o resto, o MK1 GTI, no seu desenho rectilíneo e descomprometido, é muita lindo. Ou não é?

Características técnicas aqui.

E um excelente - e cinematograficamente belo - ensaio comparativo GTI MK1 / GTI MK7, da Drive Tribe:





quinta-feira, janeiro 17, 2019

Os gigantes outra vez.

Postei em Dezembro um clip desta lindíssima obra dos Young The Giant. Mas o clip era manhoso. Este é decente. Volto à carga.



Young The Giant . Superposition

Clássicos de culto: o Jaguar E-Type de 1961.

Há quem diga, Enzo Ferrari incluído, que este é o mais belo carro já construído. E é difícil contradizer a afirmação porque o Jaguar E-Type é, factualmente, uma obra prima. Lançado em 1961 e fabricado até 1975 pela há muito extinta Jaguar Cars Ltd, o E-type encerrava no seu voluptuoso chassis monocoque o melhor que a indústria britânica tinha para oferecer ao mundo, incluindo um inovador sistema de suspensão independente e um motor de 4 litros tecnologicamente evoluído que debitava 265 cavalos. Para a altura, isto era um super carro. 60 anos depois, ainda é.

Características técnicas aqui.

quarta-feira, janeiro 16, 2019

O Síndroma Gilette ou a guerra dos sexos no fio da navalha.



Carregar os produtos com ideologia é o novo trend das grandes companhias americanas e a recentemente lançada campanha da Gilette é um eloquente sinal dos tempos. Depois da Nike entrar na guerra das raças, o líder mundial de lâminas de barbear entra na guerra dos sexos. E este filme é muito simplesmente ofensivo. Mais: é ofensivo com os clientes da marca, propondo um retrato dos homens que é profundamente injusto e redutor. Alguém precisa de dizer a estes senhores (e a estas senhoras) que os homens, na sua esmagadora maioria, não tratam mal as mulheres. Na verdade, os homens, na sua esmagadora maioria, adoram as suas mulheres, as suas mães, as suas filhas. Alguém precisa de dizer a estes senhores (e a estas senhoras) que não cabe a uma marca de lâminas de barbear fazer juízos sobre o comportamento dos seus clientes ou procurar alterar a identidade masculina. Que não têm legitimidade institucional, intelectual ou moral para se armarem aos cucos politicamente correctos da Woke Culture.

A realizadora deste lamentável spot é Kim Gehrig, uma feminista dos sete costados. E contratar uma feminista para realizar um spot de lâminas de barbear é, por si só, um critério tão insensato que só podia dar nisto.

Mas é claro que a Gilette não discrimina apenas em função do género. Na imagem em cima, retirada do filme, só encontramos homens brancos, transformados numa espécie de maléficos-robots-viradores-de-hamburgueres, que entoam repetidamente a mesma frase condescendente para com os seus inúmeros pecados brutais: boys will be boys. Na sequência da narrativa percebemos que os únicos homens decentes são negros. Esses estão acima da brutalidade masculina. E pedem justiça.

Como já escrevi aqui no blog, a esquizofrenia do capitalismo na versão Século XXI é esta: combater os valores do cliente. Ou simplesmente ofendê-lo de tal maneira que ele opte por outra marca. A Nike não quer homens brancos na sua quota de mercado; a CNN não quer ter audiências; a Google não quer ter subscritores que discordem das opiniões da Google; o Facebook não respeita a privacidade de ninguém; as marcas de automóveis de combustão interna (um dos produtos mais amados pelas pessoas na história universal da indústria humana) querem passar a produzir veículos eléctricos sem necessidade de condutor (até sem necessidade de proprietário); há cadeias de restaurantes que incluem no seu merchandising t-shirts com mensagens políticas e há marcas de gelados que recomendam resistência à administração Trump. 

Em Portugal temos uma caso paradigmático, que é o do Observador. Anunciado como um jornal de centro direita, e estabilizando nessa área o seu mercado de leitores e assinantes, recrutou uma redacção que é constituída inteiramente por millenials de esquerda. O resultado é deprimente. Basta uma visita rápida à caixa de comentários de uma notícia qualquer da área política para perceber o divórcio que existe entre os jornalistas e os consumidores do jornalismo.

Não é preciso dizer que o capitalismo que odeia os consumidores, como um negócio que desdenha os clientes, está condenado. É, na verdade, pior que o socialismo: trata-se de uma patologia.

E eu sei bem que não vou comprar nem mais uma lâmina Gilette até que o diabo me carregue para o inferno.


Spot da Gilette:




Matt Christiansen discorre assertivamente sobre este assunto:


segunda-feira, janeiro 14, 2019

A caixa que vai mudar o mundo.

Este é o Q System One, o primeiro computador quântico da IBM. É um caixote com 3x3x3 metros que na verdade não caberia no teu escritório, caro leitor, e que não tem ainda grande préstimo porque não devem existir mais que umas cinco mil pessoas no mundo que saibam operá-lo e porque aquilo que consegue fazer não supera, neste momento, o que faz um Apple topo de gama dez vezes mais pequeno, dez mil vezes mais barato e bastante mais amigável.
Mas atenção: A IBM conseguiu criar um modelo técnico que garante estabilidade e estanquidade, permitindo que o sensível e gelado ambiente de processamento quântico - que exige total isolamento e temperaturas próximas do zero absoluto - não seja contaminado ou perturbado. Este é um passo muito significativo para a industrialização de uma geração tecnológica de computadores que vai mudar, radicalmente, o mundo.
Se eu disser que, dentro de 15 a 25 anos, poderemos ir à Worten comprar um computador acessível e facilmente operável, cujo processador seja constituído por qubits* e que por isso oferecerá performances inimagináveis (e sistemas de inteligência artificial que transcendem a ficção científica de agora), não devo estar a sonhar muito alto. A ver vamos.



*Sobre este assunto, no Blogville:
A diferença entre um bit e um qubit é que um bit ou é zero ou é um. Um qubit pode ser, no mesmo momento, zero e um. Mais: pode ser o zero e o um de outro qubit.

sexta-feira, janeiro 11, 2019

Clássicos de culto: o Mercedes Benz W110 de 1959.

No paleolítico ano de 1959, a Mercedes lançou o W110, mais conhecido como 190 Heckflosse (traseira de barbatana). Conjugando com suprema elegância o conservadorismo estilístico da marca de Estugarda com o arrojo exuberante que estava em moda na altura, este é, na minha opinião, o sedan mais bonito da história da indústria automóvel.
Características técnicas aqui.

segunda-feira, janeiro 07, 2019

Sobre a existência de Deus na ausência de Fé.


"Scientists are slowly waking up to an inconvenient truth - the universe looks suspiciously like a fix."
Paul Davies . Professor de Física . Arizona State University
 
Tintoretto . Criação dos Animais . 1551-52

Vivi quarenta e cinco anos, mais coisa menos coisa, como ateu. Considero que nos últimos cinco a dez o meu pensamento teológico divergiu para um agnosticismo transitório, porque desconfio bem que morrerei crente.
Porém, o crente tem necessitado historicamente de um elemento crucial de que sou e serei sempre despojado: a fé. É a fé que tem consistentemente oferecido ao crente a certeza da existência de Deus, apesar do cosmos diabólico em que vive mergulhado. Sem fé, é difícil conciliar a presença do mal com a omnipotência divina. É psicologicamente complicado permanecer fiel a um Deus que se ausenta, quando mais precisamos dele. Que é cego, quando se manifesta a injustiça e surdo a súplicas de redenção.
Este meu trânsito do ateísmo ao agnosticismo não se fez, claro, pela fé que me é impossível, mas muito porque vivo num momento da história em que, para acreditar na existência de Deus, ou pelo menos para não negar em absoluto essa possibilidade, a fé já não é necessária. A razão serve perfeitamente, agora. A irónica e dialéctica ideia aqui é que eu posso substituir facilmente a virtude da fé pela virtude da ciência. Sim, o espírito científico e racionalista que foi muito responsável pela agonia das religiões ocidentais nos últimos 3 séculos, está a fechar o seu ciclo epistemológico com concludentes argumentos em favor da existência de Deus.

Tenho escrito aqui no blog sobre este assunto (dois recentes exemplos aqui e aqui), mas geralmente a conversa reduz-se ao campo das Físicas. Porém, as disciplinas da Biologia e da Neurologia são capazes de ser, neste momento, mais eloquentes. Para além da ignorância em que vivemos ainda sobre matérias tão básicas como a natureza e topografia da consciência, a residência e constituição material da memória, a necessidade do sono e a composição físico-química dos sonhos, por exemplo, a ignorância fundamental é a da mecânica da criação. Como é que a vida surgiu no planeta Terra? Nenhum cientista ateu faz a mínima ideia. Até porque sabemos bem que o encadeamento proteico necessário ao DNA e à vida - num universo sem criador inteligente - é estatisticamente impossível. E como as máquinas de criação proteica são feitas de proteínas, sobra apenas o axioma equívoco do ovo de onde saiu a galinha que o pôs. E eis aquilo a que chamaria o Primeiro Argumento Biológico em Favor da Existência de Deus: a impossibilidade matemática da geração espontânea e aleatória de proteínas implica o seu desenho inteligente.

Para investigar sobre a validade deste Primeiro Argumento Biológico, ninguém melhor que J. Warner Wallace, detective da brigada de homicídios de La Miranda e professor de Apologia Cristã na Universidade da Califórnia. São 15 minutos que recomendo a qualquer ateu. Wallace é um orador brilhante e a ciência está extremamente bem explicadinha.



J. Warner Wallace . How the Origin of Life Points to the Existence of God

Mas a ideia de que a realidade observável de um universo sem transcendência é insuficiente para justificar toda a completude da existência não é válida apenas pela incapacidade da ciência em demonstrar o contrário. Podemos lá chegar pelos livros e pela sabedoria ancestral que neles foi gravada, por exemplo. Porque queremos saber o que estamos aqui a fazer e podemos aprender muito sobre esse assunto com a sabedoria acumulada de milénios. Ricardo Araújo Pereira, nesta breve e emocionante palestra, diz que ateus e crentes, cientistas e teólogos, humoristas e priores, todos partilhamos essa procura pelo significado da existência. E todos nos encontramos, no percurso dessa odisseisa, para além dos limites da realidade positivista, mesmo que em pontos diferentes do espaço-tempo.


Ricardo Araújo Pereira . Espiritualidade Sem Fé. 

A esta tese chamaria Primeiro Argumento Psicológico em Favor da Existência de Deus: a inevitável senda pelo significado da existência coloca invariavelmente o ser humano num plano transcendental.

sábado, janeiro 05, 2019

Que malha de filme.

Estou sempre a amaldiçoar as artes do século XXI. Devo assinalar quando estou errado. E estou errado, comprovadamente, quando confrontado com este magnífico pedaço de cinema, da genial autoria de Alfonso Cuarón. Fita lindíssima.



Roma . Dir.: Alfonso Cuarón . 2018

Pela Estrada Fora #15

A Minha Batalha
Uma breve apologia da combustão interna. E dos Concertos de Brandenburgo.


Tudo o que queria fazer, no caminho de regresso do Canhão da Nazaré, era tirar um excelente boneco do meu carrinho lindo com o Mosteiro da Batalha no fundo. A inocência, caída subitamente no poço da realidade, tem cruéis resultados no ânimo da alma e a simples intenção de estacionar o automóvel nas imediações do Mosteiro é um projecto destinado à falência onírica: a vila de Batalha tem, neste contexto, os mesmos problemas da cidade de Nova Iorque, sendo certo que se compreendem melhor as dificuldades de parquear na península de Manhattan do que no coração do Oeste Português.

Odiar os automóveis de combustão interna, restringindo seu trânsito, taxando de forma obscena a sua função, aniquilando ou tentando aniquilar o prazer da condução enquanto se rouba boa parte ao comércio dos combustíveis, é a nova norma. A minha Batalha é que a nova norma não passe a normal.

O automóvel de combustão interna é uma das grandes glórias tecnológicas da história da humanidade. Está para a indústria como os Concertos de Brandenburgo estão para a música. As duas  obras servem esplendidamente para nos transportar do ponto A ao ponto B. Num caso os pontos são geográficos, noutro são estéticos, mas o assunto é o mesmo: liberdade. 



Não deixo de ficar impressionado com a paisagem arqueológica. E nunca, por nunca, cesso o espanto de ser nacional de um país que se consolidou através desta gloriosa Batalha, travada com valentia e argúcia estratégica no remoto ano de 1385. E nunca, por nunca, cesso de venerar esse D. Nuno imortal. Mas quando finalmente encontrei um lugar para estacionar, tudo o que consegui foi isto:

É claro que fiquei a quilómetros do que sonhava (o mosteiro está lá ao fundo, do lado esquerdo). Mas um gajo que gosta de automóveis está condenado às milhas. Se calhar é justo. Se calhar não. Não sei se já pensaste nisto, gentil leitor, cordial leitora, mas quando os motores de combustão interna forem levados à extinção industrial, o que é que fica para taxar? O que é que fica para odiar?

É que agora estão só a lixar a minha mania. A ganhar a minha Batalha. A vencer sobre a minha fantasia. Mas com o mesmo intento fascista, cuidarão de destruir a tua, já de seguida.