sábado, setembro 26, 2020

Haikus da Lagoa Mar.



 


Onde é que acaba a lagoa
e começa o oceano?
O Flamingo sabe.



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Nas dunas,
estás noutro planeta.

Passa um turista.


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O Atlântico bate na praia
como um pai violento
e embriagado.


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Ruge e roga pragas
o oceano zangado.
Para quando a paz?


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Até os meus cães sabem
que esta terra
não é deles.




 

A paisagem pede versos
e eu estou a ficar
sem tinta.


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No coração do Atlântico Norte
nasceu a onda que agora rebenta
nos meus tímpanos.


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Outubro e
os flamingos rumam a sul.
Não são parvos nenhuns.


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Podes ser amado pelos deuses,
mas no café és maltratado
como toda a gente.


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O haiku já está escrito.
Eu limito-me a procurar por ele
entre as dunas.






 

Durante a madrugada
rolam tractores na praia.
O Atlântico faz mais barulho.

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Às vezes sinto a presença de Deus.
Mas é raro.


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50 quilómetros de praia virgem
sem 50 horas de aviação.


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As ondas hoje estão simpáticas.
Para quem não vai
ao banho.


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Há pessoas que gostam de levar porrada.
Das ondas.






 

A sós com a natureza.
Borro-me de medo.


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Insectos.
Ataques de mau feitio
da Mãe Natureza.


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A rã coaxa. O grilo canta. O mar protesta.

O silêncio vence.


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O mundo podia cair em apocalipse
que eu aqui
nem dava por ela.


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Esqueci-me do casaco em Lisboa.
Nortada.







 

Tremo e vibro e vou com a maré
na Praia da Costa
de Santo André.

quinta-feira, setembro 24, 2020

Como é óbvio.

Parece que um juíz federal americano chegou à conclusão óbvia para toda a gente de bom senso: num estado de direito constitucional, qualquer lockdown é uma iniciativa fundamentalmente ilegal.


terça-feira, setembro 22, 2020

Tugas no topo.

 

A propósito de momentos épicos, Filipe Albuquerque ganhou a categoria LMP2 nas 24 Horas de Le Mans, ao volante do Oreca nº 22 da United Autosports. E António Felix da Costa fez segundo, na mesma categoria. Dois portugueses num pódio de muito difícil acesso. Parabéns aos pilotos e viva Portugal, caraças.

50 minutos para a história.



Não é preciso gostar de ciclismo. Basta, por exemplo, ter interesse em história do desporto para ver e rever a última hora da etapa 20 do Tour de France, que se disputou ontem, em modo crono-escalada (contra-relógio de montanha). É o momento mais épico do desporto de alta competição do século XXI, isso é certo. O eslovénio Primoz Roglic, favorito dos favoritos, partiu para esta etapa convencidíssimo - como toda a gente estava convencida - que o Tour deste ano estava no papo. Tinha 57 segundos de vantagem sobre o seu compatriota Pogacar, um puto que faz hoje 22 anos e que, ao contrário de Roglic, que corre numa super equipa, pedalou sozinho entre os gigantes da prova durante boa parte, a parte da alta montanha, das três semanas. Enganou-se redondamente. Pogacar pedalou como um deus e deixou Tom Dumoulin, o segundo classificado da etapa, especialista no contra-relógio e outra super-estrela do ciclismo internacional, a mais de um minuto e vinte. Roglic perdeu um minuto e cinquenta e teve que despir a camisola amarela, engolir em seco e chorar um bocadinho. Desde o célebre duelo dos anos 80 entre Laurent Fignon e Greg LeMond que não se via nada assim. Já passaram 24 horas e eu continuo para aqui de queixo caído. Tadej Pogačar, na sua primeira participação nesta lendária prova, arrecadou, num esforço glorioso e espectacular de 50 minutos, a camisola amarela, a camisola da montanha e a camisola branca, tornando-se o primeiro ciclista desde Eddy Merckx a terminar o Tour com 3 camisolas no saco e o mais jovem vencedor desde 1904 (!). Acresce que a probabilidade de dois eslovenos disputarem a vitória na volta à França deve ser de um para dois mil milhões ou assim. Que coisa de doidos.
E ainda há gente que gosta de futebol.

sexta-feira, setembro 18, 2020

Soneto da Praia da Armona.



A ilha-língua estende-se em pitagórica bissectriz
Sobre os limites do horizonte e a orla do oceano.
O universo abre via verde e sorri solarengo o céu sano
Que mostra a sua virtude, longitude e matriz.

Faz uma tarde perfeita e na esplanada-imperatriz
Ameijoas e vinhos saúdam o queijo e a azeitona.
Erguem-se bravos os copos entre as dunas da Armona
E corremos atrás do barco que abordamos por um triz.

A ria vibra, a vida brilha, o sol perdura
e a dada altura levanta-se um sapiens que diz:
Até o caixote do lixo está feliz.

Percorremos livres o Portugal pequeno
de seno a cosseno e na tangente o sobrinho diz:
Até o caixote do lixo está feliz.

quinta-feira, setembro 17, 2020

A verdade que vem do frio.


Esta notícia é daquelas oportunidades que tenho para deixar de ser o prego e passar a ser o martelo. Não a posso perder.
Primeiro: alguém vai ser já despedido, no Diário de Notícias. Publicar a verdade neste jornal (como nos outros todos, mas muito especialmente neste) é algo de imperdoável e terá consequências sérias. Isso é certo.
Depois: tenho que chatear um bocadinho a malta que me partiu a cabeça, aqui no Facebook e noutros lugares, nos meses de março e abril e junho e julho e agosto (vocês sabem quem são). Sim, vocês malta adepta de confinamentos e entusiasticamente concordante com a retirada dos direitos mais básicos da civilização ocidental, terão alguma coisinha de pertinente a dizer sobre este muito incómodo e inconveniente facto sueco?
E a outra malta, a malta que desgraçadamente elegemos para tomar apenas as piores decisões, no exacto momento em precisávamos das melhores, reconhecerá porventura o imenso, histórico e, tudo indica, criminoso erro?
Claro que não.
Uns como outros permanecerão convictos das suas vilanias porque a realidade não interessa. O que interessa, para uns e para outros, é que a narrativa se mantenha firme e não altere as horas de sono nem as lógicas de poder. Custe o que custar.
Certo, rapaziada?

quarta-feira, setembro 16, 2020

My name is joe Biden and I forgot this message #n

Há um séria probabilidade deste débil, confuso e senil senhor ser eleito para presidente dos Estados Unidos da América. E caso não seja, há outra séria probabilidade: a da guerra civil.
Eis o mundo como uma conspiração de estúpidos.


A discoteca da minha vida: discos 61 a 65

#61 - A Maximum High - Shed Seven

1996. Shed Seven, a operática banda de York, edita o seu segundo trabalho de estúdio: "A Maximum High", que é factualmente uma pedra máxima no panorama apoteótico da britpop desse momento histórico. Não faltam grandes discos a essa apoteose; já inclui uns, já exclui outros, mas estes rapazes ficam. A sofisticação melódica, a energia incomensurável e a pretensão circense, que resulta encantadora, fazem dos Shed Seven um incontornável monumento-rock. E deste disco, uma ode de fim de século.
Are you going for gold?
Bum.




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#62 - Moon Safari - Air

1998. Dois franceses meio lunáticos que gostam de se entreter com sintetizadores analógicos lançam o seu primeiro trabalho de estúdio, a que muito apropriadamente decidem chamar "Moon Safari". A partir daqui, nada vai ser como dantes. A partir daqui há virgens suicidas e space pop. Há walkie talkies dançantes e lendas de 10.000 hertz. Há sinfonias de bolso e melodias inesquecíveis, de uma delicadeza inebriante. A partir daqui, há Air para respirar.
Disco iniciático.




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#63 - Prolonging The Magic - Cake

Os croonies do rock and roll atacam pela terceira vez em 1998: "Prolonging The Magic" é um ensaio cool, frank sinatrista, sobre o destino do pop rock alternativo. Uma piada privada, que só consegues entender se perceberes que o maior êxito dos Cake até aqui tinha sido um cover da Gloria Gaynor.
Embora neste caso seja fácil escolher o melhor disco da banda, é porém excruciante eleger uma música para a caixa de comentários, porque este disco encerra uma porrada de temas realmente poderosos, esplendidamente orquestrados e carregadinhos da ironia que é característica desta malta da Califórnia.
Estou a ouvir este magnífico disco e a pensar para comigo que os últimos anos do século XX foram musicalmente riquíssimos. E algo ingénuos. E uma coisa tem a ver com a outra.
Disco iniciático.




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#64 - International Velvet - Catatonia

Entra na discoteca da minha vida a galesa Cerys Matthew, proprietária de uma das mais belas e texturadas vozes dos anos 90. "International Velvet", o segundo disco dos Catatonia, é completamente um espelho do rock que se fazia na altura: vibrante e sensual, vociferante e confessional, tentando o equilibrio impossível entre a rebeldia e a fome de fama.
O vigor lírico das cordas vocais e dos poemas de Cerys, e o poder libertador da guitarra de Mark Roberts preencheram uma boa parte da dimensão acústica dos meus dias de fim de século. E é com alguma nostalgia que volto a ouvir estas explosões de talento e energia criativa.
Uma banda muito minha. Que eu adorava.
 
 
 
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#65 - Version 2.0 - Catatonia

Os Garbage não envelheceram bem, é verdade. Mas esta não é a lista dos discos que envelheceram bem, mas sim a lista dos discos da minha vida e "Version 2.0" tem que constar, porque o pop aveludado, meio decadente e deveras diletante desta banda constava absolutamente da grafonola ideal do fim dos anos 90. E este disco está repleto de malhas que arrendaram para sempre uns milímetros de residência no congestionado e caótico imobiliário da minha memória timpânica. Next.

terça-feira, setembro 15, 2020

O Prémio Nobel da Paz já não presta ou nunca prestou?

Correm tempos de tal forma esquizofrénicos que de repente podemos verificar que estamos perigosamente de acordo com os nossos inimigos. Recentemente, publiquei no facebook um post em que concordava com um artigo do obsceno panfleto propagandístico a que ainda têm a lata de chamar Washington Post. Quer dizer, concordava com a conclusão desse artigo, não com as razões que resultavam nessa conclusão: depois das eleições presidenciais de novembro, vai haver merda nos EUA. Hoje estou de acordo, da mesma forma, com este infeliz artigo do outrossim grotesco "The Atlantic".  Sempre achei que o Prémio Nobel da Paz é uma palhaçada sem nome. Já foram premiados terroristas. Já foram premiados ditadores. Estão constantemente a serem premiados imbecis. E todos, ou quase todos, com algo em comum: são gente de esquerda. O critério é ideológico e absolutamente parcial pelo que, por minha vontade, já devia ter sido cancelado.
Acontece que, como Trump tem este ano e até ver, duas nomeações para este triste e vergonhoso troféu, a esquerda quer já cancelar a coisa. E lá está: por razões simetricamente opostas, estamos todos de acordo. Creepy.

segunda-feira, setembro 14, 2020

Totalitarismo total.

Uma rapariga, grávida, é presa na Austrália por ter publicado um post no Facebook onde convidava os seus amigos a participarem num protesto contra o lockdown imposto pelo governo. Se isto não é tirania, não sei bem o que é tirania, afinal.


segunda-feira, setembro 07, 2020

Avante Xiquinho, avante.

Montes de gente com quem falo, à esquerda e à direita (não há muita gente de direita neste país, mas adiante) está muito revoltada por causa da festa do Avante. Eu não. Eu acho muito bem que o PCP faça a sua festa. Acho que toda a gente devia fazer festas, até. Por exemplo, acho que o Xico Zé ou Xiquinho Maria ou lá como é que se chama o actual e completamente imbecil líder do partido do táxi, aka CDS, também devia fazer uma festa. Uma festa à antiga, num palácio de Cascais com os betinhos todos e todas as gajas boas da concelhia e bar aberto e iates a atracar e a desatracar toda a noite. Uma festa que incluisse zaragatas, presença policial e escândalo nos jornais. Uma festa que só terminasse às dez da manhã que é a altura do chá e dos scones. Talvez até conseguisse o infeliz rapazinho uns votos a mais, nem que fosse por as pessoas perceberem que é um gajo com os tomates no sítio em vez de um personagem translúcido. Mas não. Em Portugal só o Partido Comunista é que tem tomates - e poder - para mandar o Costa e as suas restrições idiotas à merda.

Parabéns ao PCP. Condolências a todas as restantes cabeças de gado.

sexta-feira, setembro 04, 2020

A vingança de Mao

Cinco minutos arrepiantes.

Neste segmento do Tucker Carlson Tonight de ontem fica claramente demonstrado que as eleições presidenciais de Novembro próximo nos EUA são uma espécie de barril de pólvora num armazém que já está em chamas, numa terra sem bombeiros.


quinta-feira, setembro 03, 2020

Tempos perigosos.

China blasts Trump over his response to US unrest | Financial Times
Não sei se já vimos e vivemos o pior de 2020, sinceramente.
No contexto de barricada material, ideológica e psicológica que hoje é imanente nos Estados Unidos, há uma probabilidade séria das eleições presidenciais de Novembro terminarem num processo de secessão.
E se a soma da epidemia com o desassossego social já configurava uma espécie de tempestade perfeita, imaginem as consequências - locais e globais; económicas e sócio-políticas - de uma segunda guerra civil americana.

Exemplo das posições loucamente extremadas de que falo é esta frase de Andrew Cuomo, o governador do estado de Nova Iorque: "Trump had better have an army to protect him if he comes to NYC".
Convenhamos: isto não é normal. E se nas ruas das principais cidades americanas a turba insulta, incendeia, pilha, violenta e mata de forma impune (não sei se estas notícias chegam aos media portugueses porque não os consumo, mas desconfio que não), o discurso dos líderes políticos da federação não parece estar a um nível muito diferente. E este é só um exemplo de hoje. Há milhares nas últimas semanas.
 
O Washington Post dos tempos que correm é demente, propagandístico e desaconselhável à brava. Mas ainda assim, eu e os marxistas da respectiva redacção conseguimos estar de acordo por um momento, como o relógio parado consegue estar certo duas vezes por dia: as eleições presidenciais que se avizinham dificilmente terão um desfecho conclusivo e pacífico. 

Tanto mais que este ano a "noite eleitoral" vai durar duas semanas ou coisa que o valha, por causa do voto por via postal. E duas semanas é tempo suficiente para incendiar o resto da América que ainda não ardeu.
 
Não quero parecer fatalista, mas não me lembro de viver tempos tão voláteis e perigosos desde a Guerra Fria. Talvez até mais voláteis, talvez até mais perigosos.