Não é preciso gostar de ciclismo. Basta, por exemplo, ter interesse em história do desporto para ver e rever a última hora da etapa 20 do Tour de France, que se disputou ontem, em modo crono-escalada (contra-relógio de montanha). É o momento mais épico do desporto de alta competição do século XXI, isso é certo. O eslovénio Primoz Roglic, favorito dos favoritos, partiu para esta etapa convencidíssimo - como toda a gente estava convencida - que o Tour deste ano estava no papo. Tinha 57 segundos de vantagem sobre o seu compatriota Pogacar, um puto que faz hoje 22 anos e que, ao contrário de Roglic, que corre numa super equipa, pedalou sozinho entre os gigantes da prova durante boa parte, a parte da alta montanha, das três semanas. Enganou-se redondamente. Pogacar pedalou como um deus e deixou Tom Dumoulin, o segundo classificado da etapa, especialista no contra-relógio e outra super-estrela do ciclismo internacional, a mais de um minuto e vinte. Roglic perdeu um minuto e cinquenta e teve que despir a camisola amarela, engolir em seco e chorar um bocadinho. Desde o célebre duelo dos anos 80 entre Laurent Fignon e Greg LeMond que não se via nada assim. Já passaram 24 horas e eu continuo para aqui de queixo caído. Tadej Pogačar, na sua primeira participação nesta lendária prova, arrecadou, num esforço glorioso e espectacular de 50 minutos, a camisola amarela, a camisola da montanha e a camisola branca, tornando-se o primeiro ciclista desde Eddy Merckx a terminar o Tour com 3 camisolas no saco e o mais jovem vencedor desde 1904 (!). Acresce que a probabilidade de dois eslovenos disputarem a vitória na volta à França deve ser de um para dois mil milhões ou assim. Que coisa de doidos.
E ainda há gente que gosta de futebol.