quarta-feira, janeiro 16, 2019

O Síndroma Gilette ou a guerra dos sexos no fio da navalha.



Carregar os produtos com ideologia é o novo trend das grandes companhias americanas e a recentemente lançada campanha da Gilette é um eloquente sinal dos tempos. Depois da Nike entrar na guerra das raças, o líder mundial de lâminas de barbear entra na guerra dos sexos. E este filme é muito simplesmente ofensivo. Mais: é ofensivo com os clientes da marca, propondo um retrato dos homens que é profundamente injusto e redutor. Alguém precisa de dizer a estes senhores (e a estas senhoras) que os homens, na sua esmagadora maioria, não tratam mal as mulheres. Na verdade, os homens, na sua esmagadora maioria, adoram as suas mulheres, as suas mães, as suas filhas. Alguém precisa de dizer a estes senhores (e a estas senhoras) que não cabe a uma marca de lâminas de barbear fazer juízos sobre o comportamento dos seus clientes ou procurar alterar a identidade masculina. Que não têm legitimidade institucional, intelectual ou moral para se armarem aos cucos politicamente correctos da Woke Culture.

A realizadora deste lamentável spot é Kim Gehrig, uma feminista dos sete costados. E contratar uma feminista para realizar um spot de lâminas de barbear é, por si só, um critério tão insensato que só podia dar nisto.

Mas é claro que a Gilette não discrimina apenas em função do género. Na imagem em cima, retirada do filme, só encontramos homens brancos, transformados numa espécie de maléficos-robots-viradores-de-hamburgueres, que entoam repetidamente a mesma frase condescendente para com os seus inúmeros pecados brutais: boys will be boys. Na sequência da narrativa percebemos que os únicos homens decentes são negros. Esses estão acima da brutalidade masculina. E pedem justiça.

Como já escrevi aqui no blog, a esquizofrenia do capitalismo na versão Século XXI é esta: combater os valores do cliente. Ou simplesmente ofendê-lo de tal maneira que ele opte por outra marca. A Nike não quer homens brancos na sua quota de mercado; a CNN não quer ter audiências; a Google não quer ter subscritores que discordem das opiniões da Google; o Facebook não respeita a privacidade de ninguém; as marcas de automóveis de combustão interna (um dos produtos mais amados pelas pessoas na história universal da indústria humana) querem passar a produzir veículos eléctricos sem necessidade de condutor (até sem necessidade de proprietário); há cadeias de restaurantes que incluem no seu merchandising t-shirts com mensagens políticas e há marcas de gelados que recomendam resistência à administração Trump. 

Em Portugal temos uma caso paradigmático, que é o do Observador. Anunciado como um jornal de centro direita, e estabilizando nessa área o seu mercado de leitores e assinantes, recrutou uma redacção que é constituída inteiramente por millenials de esquerda. O resultado é deprimente. Basta uma visita rápida à caixa de comentários de uma notícia qualquer da área política para perceber o divórcio que existe entre os jornalistas e os consumidores do jornalismo.

Não é preciso dizer que o capitalismo que odeia os consumidores, como um negócio que desdenha os clientes, está condenado. É, na verdade, pior que o socialismo: trata-se de uma patologia.

E eu sei bem que não vou comprar nem mais uma lâmina Gilette até que o diabo me carregue para o inferno.


Spot da Gilette:




Matt Christiansen discorre assertivamente sobre este assunto: