Ainda na senda do fabuloso ano de 1998, chamo ao palco uma das minhas bandas pop favoritas de sempre e para sempre: The Cardigans. Se a Suécia foi capaz de parir qualquer coisa de decente depois dos Abba, foram estes cinco magníficos. Nina Persson, a vocalista fatalista, nasceu com o rabiosque virado para a lua, nitidamente, porque, para além de ser um borracho de cair para o lado, e de se apresentar como competente escrevinhadora de rimas, é senhora de uma voz cujo poder imenso está entre o erotismo e o pudor, entre o desespero e o apogeu romântico, num festival lírico capaz de arrepiar os pelos da nuca a qualquer eunuco. Mais a mais, podia contar com uma orquestra de bolso à altura, liderada por Peter Svensson, músico completo, produtor, compositor e géniozinho discreto que se entretém hoje em dia a escrever canções para que certos artistas mainstream, que nem nomeio porque são meio obscenos, ganhem grammys com fartura. Os próprios The Cardigans ganharam 4 destes infames prémios, entre muitos outros infames prémios, o que constitui talvez o seu único defeito.
"Gran Turismo", o quarto dos 6 trabalhos de estúdio, é um daqueles discos encantados, abençoados por deus e lindíssimos por natureza, concebidos num máximo momento de inspiração e que vivem, por isso, para sempre. O que não é fácil, considerando que se trata de um trabalho de grande simplicidade, sem pretensões nenhumas nem gorduras de ambição desmedida. "Gran Turismo" é exactamente e apenas aquilo que quer ser: um descomprometido - mas eloquente - exercício de música popular.
E a prova da abismal competência dos The Cardigans é que podemos ouvi-los 22 anos depois sem correr o risco da decepção: continuam tão contemporâneos como eram. E elegantes como sempre foram.