domingo, fevereiro 14, 2021

Coreia do Sul. A nova meca da criação televisiva.

Porque as indústrias de entretenimento ocidentais foram transformadas em fábricas de propaganda neo-marxista barra politicamente correcta, que debitam toneladas diárias de conteúdos aborrecidos, repetitivos, medíocres, deprimentes, estéreis e extremamente irritantes, eu e a minha mulher optámos, aqui há coisa de ano e meio, por procurar outras sedes de produção televisiva e cinematográfica.

Descobrimos rapidamente a abundante, criativa e para-ideológica fonte coreana. Desde essa altura, não consumimos praticamente mais nada a não ser estas sagas, dedicadas a temas históricos ou contemporâneos, que primam pelo impulso épico (e correspondente generosidade de recursos), irrepreensível qualidade de produção, exuberância cenográfica, intensidade emocional, inesgotável vitalidade criativa e impecável direcção de actores.

Mr. Sunshine . Netflix

As séries coreanas não têm medo do belo. Não recusam o imaginário clássico. Não rejeitam o apelo romântico. São filosoficamente liberais, são abertamente dialécticas, mas não entram nos horrores das políticas de identidade e do relativismo moral e sabem separar bons e maus valores, definir o herói e definir o vilão, estabelecer o papel do homem e o papel da mulher, distinguir as lógicas de poder das teias da corrupção e nunca cair na tentação de atribuir qualidades ou defeitos a personagens em função da sua nacionalidade, cor da pele, estatuto social ou preferência sexual. Em síntese: as séries coreanas não são pós-modernas.

 
Stranger
. Netflix

Acresce que a produção coreana manifesta, sempre e sem excepção, um pudor no que diz respeito à nudez e à intimidade romântica entre os personagens que é absolutamente balsâmico. Podemos passar 50 episódios de uma série sem que os protagonistas troquem mais que um ou dois beijos. Não há cenas de sexo explícito ou implícito. Não há nudez. Há apenas beleza. Elegância. Recato. Esta ética não diminui, claro, a intensidade romântica do produto final. Muito pelo contrário. Já há muitos anos que não era sensibilizado por uma história de amor como consigo ser emocionado por várias destas poderosíssimas rábulas passionais. 

A este propósito, há que realçar um facto: dada a quantidade de actores e actrizes extremamente bem parecidos que a indústria consegue lançar (raramente vemos os mesmos actores protagonizar séries diferentes) chegamos facilmente à conclusão que a Coreia do Sul é um país de gente bonita. E de gente educada. A forma como, nas produções sobre temas actuais, as pessoas se cumprimentam e se relacionam, bem como as causas que defendem os heróis das histórias, revela a civilidade social e um bom entendimento da razão moral que imperam na nação. Não por acaso, descobrimos que os valores cristãos são muito populares junto dos coreanos, que foram, logo desde a sua fundação, bastante influenciados pelas igrejas ocidentais


Vagabond
. Netflix

O que digo do sexo, posso também dizer das cenas de acção. Ferve porrada na maior parte destas produções mas nunca de forma gratuita. Nunca de forma a promover a violência pela sua espectacularidade pueril, mas pela sua justificação moral. O sangue não escorre gratuitamente e a sua exibição é cuidadosamente estudada de forma a ser consistente com a narrativa. As séries sobre temas actuais são mais violentas do que as históricas, mas podemos sempre contar com coreografias de qualidade superior, mesmo em relação ao que é feito em Hollywood. Sejam sequências de grandes batalhas ou duelos individuais, o engenho técnico empregue na acção resulta em cenas absolutamente estonteantes e altamente realistas, que espantam pela ambição e pelos meios colocados ao serviço da cinematografia.

Não costumo recomendar séries coreanas, porque sei que as pessoas têm uma ideia estereotipada e profundamente errada da produção asiática. Mas desta vez arrisco uma sugestão. "Six Flying Dragons" (ou "Roots of The Throne", na versão para consumo ocidental) é um magnífico fresco sobre a história da fundação do reino de Joseon, que deu origem à nação Coreana. São 50 episódios de uma hora cada que deslumbram os sentidos, entretêm a sensibilidade e elevam o espírito como poucos produtos televisivos. A série é conceptualmente ambiciosa, explorando dialecticamente questões fundamentais de disciplinas tão diversas como a Ciência Política, a Psicologia Social e a História. Mais a mais, está disponível, com qualidade técnica, no Youtube.


Six Flying Dragons
. SBS DramaCool (disponível no Youtube em full HD com legendas em inglês)

Seja como for, é muito consolador saber que ainda há povos que vivem de acordo com referências civilizacionais saudáveis, parâmetros estéticos objectivos e modelos éticos que têm por base tradições ancestrais que demonstraram ser válidas através dos tempos. Esse bom conservadorismo que, lamentavelmente, foi aniquilado no Ocidente.

E assim, vou entretendo o tempo sem me estar sempre a irritar com a televisão.