Uma noite difusa de 1989. Ritz Club. Três gajos de aspecto suspeito e barba por fazer embebedam-se na mesa do canto. E escrevinham à vez, no mesmo pedacinho martirizado de papel. E que raio escrevinham? Insultos, contos de ficção científica, crónicas de alcova, novelas da meia noite, pesadelos de Boris Vian, cadáveres esquisitos de toda a ordem, relatórios da sexta cerveja, anedotas do terror da vida. Dão os três, neste ofício de cinzas, pelo mesmo nome de José de Ícaro e vão acabar por se perder pelos interstícios da vida.
17 anos depois, o alado e trifásico personagem literário reencontra-se na blogosfera. O Pedro Barros, esotérico e inspirado, pan-demónio à solta sobre o aborrecimentro da vida, já não escrevinha insultos porque deu com o crânio no poste e depurou-se assim de vilanias. O Jorge Silva, que consegue fazer literatura com as contra-indicações de um antibiótico, queixa-se dos rins e venera o Zeca Afonso, num verdadeiro desenterro mitológico. E eu, Paulo Hasse Paixão, estou para aqui encostado à minha sombra, com saudades de quando éramos pequeninos e divinos, e procuravámos o sol com asas de cera.