quarta-feira, setembro 20, 2006
7 pérolas da Colecção do Dr. Rau.
3 - JAN VAN GOYEN - Tempestade
1637, óleo sobre madeira, 23.5x36.5 cm.
É uma pena, mas esta pérola assim, em reprodução mínima e digital, não se percebe. Não se percebe o encanto, não se percebe a intensidade cénica e não se percebe sobretudo a solidão quieta do camponês. Observada na parede do M.N.A.A., percebe-se melhor: ele está de costas mas eu cá vi perfeitamente o fascínio despreocupado que ilumina o seu olhar. A tempestade aproxima-se, ameaçadora sobre os restos de luz solar que obstinadamente o iluminam ainda. As árvores corroboram a ameaça, o horizonte sopra sarilhos e a paisagem toda movimenta-se atormentada. Mas ele não. Está de perna traçada, contemplando a borrasca. Não tem pressa de chegar a lado nenhum e parece encontrar-se num ermo distante, a milhas de um abrigo que o redima. Este facto é que, para ser sincero, nem no Museu se percebe. E foi precisamente o mistério dessa permanência, como uma espécie de atitude zen sobre o abismo; foi precisamente esse despreocupado olhar sobre a tempestade que me violentou a imaginação.
Jan van Goyen pintou mais de mil e duzentas coisas destas nos sessenta anos que passeou pelo planeta: paisagens urbanas e paisagens fluviais e mais paisagens bucólicas e outras tantas paisagens rurais, sempre dentro do espírito naturalista de que foi um seguidor inveterado. Mestre na criação de atmosferas poderosas e monocromáticas, que na verdade dominam e animam todo o conteúdo imagético, van Goyen não é propriamente um génio do seu tempo e, apesar de ter deixado algumas marcas na escola holandesa do século XVII, nunca alcançou grande reputação em vida (muito porque somava à ocupação de artista a de homem de negócios, para a qual, segundo parece, não tinha talento nem carácter).
Seja como for, este boneco é magnífico, caramba, e eu sou-lhe muito grato, Sr. Jan van Goyen.