Dois em cada três portugueses não vão votar para as Europeias e fazem eles senão bem. Hoje, no primeiro debate televisivo da campanha, a dra. Adelaide de Sousa decidiu abrir as hostilidades com esta perguntinha indigente: um sujeito que trabalha das nove às cinco e recebe o ordenado mínimo deve sentir-se orgulhoso por ser um cidadão europeu?
A pergunta é tão estúpida, é reveladora de uma desfaçatez moral de tal ordem, que nem se percebe. A dra. Adelaide de Sousa pretende saber se o candidato acha que o cidadão mal pago deve estar desgostoso do seu continente porque na América do Sul os ordenados são chorudos, ou porque na China o ordenado mínimo é de 2.000 euros por semana, ou porque na maior parte dos países africanos o custo de vida é largamente superado pelos rendimentos médios da população, ou o quê, precisamente? O cidadão que é mal pago deve ser zangado com a Europa porque nos outros continentes os cidadãos são melhor remunerados? Devem todos os europeus que ganham miseravelmente ir procurar emprego para a América?
A pergunta é de tal forma produto da mais infame leviandade, que brada aos céus. Esta senhora parece achar pertinente que o cidadão europeu deve ser mais ou menos orgulhoso da sua Europa em função do ordenado que ganha. Os Alemães, por exemplo, devem adorar a Europa. Os portugueses, devem odiá-la. Este materialismo é de cair para o lado.
Não interessa nada à dra. Adelaide de Sousa a história da Europa, os triunfos civilizacionais, científicos, políticos, filosóficos ou artísticos da Europa. O que é tudo isso, perante o ordenado mínimo do cidadão que vai trabalhar das nove às cinco? Das nove às cinco, caramba!
A pergunta é de tal modo perversa, que serve de evidência para o meu argumento antigo sobre a responsabilidade da abstenção: não são só os políticos que envenenam o debate e que distanciam os portugueses da União Europeia. Não são só os políticos que dão má imagem - e má fama - à política. O jornalismo em Portugal é um dos principais problemas da nação.