segunda-feira, setembro 21, 2009
A Síndrome do Infante.
Domingo, Junho 24, 2007
Não é por acaso que aquele que foi, muito provavelmente, o mais inteligente dos portugueses, tenha dedicado grande parte da sua vida a esgalhar um plano de fuga. Como o desditoso Henrique, todo o português que se preze tem o secreto ou aberto sonho de se evadir de Portugal. Sempre achámos e continuamos a achar que o sétimo céu se esconde num canto recôndito do mundo. Como a D. João II, inquieta-nos esta pequenez marginal, esta solidão perante o mar. Como Milton, sonhamos com a queda de Lúcifer, desde que Lúcifer não faça a desfeita de cair em território nacional. O paraíso perdido está algures do outro lado da fronteira. Ou do outro lado da praia. Devo advertir a audiência que este postal não encontra razões na wikipédia nem conta com argumentos google. A partir daqui falo só de experiência humana minha: conheço gente vária que viveu em áfrica e que nunca conseguiu recuperar à infâmia do regresso. Conheço gente outra que foi acampar para a escócia e inventar utopias hippies na catalunha, que se escapou para negócios complicados em moçambique, que foi trabalhar para frança, que foi vender vinho para angola, que foi estudar para os estados unidos, que foi ganhar dinheiro para a áfrica do sul. Conheço pessoas muitas que seguiram pelo ancestral êxodo de macau e que, retornados também, sonham e anseiam por voltar àquele bocadinho chinês de terra portuguesa (este caso é mesmo muito estranho). Conheço malta com família em sidney, newark, ontário, instambul, que trabalhou em roma, que viveu em liverpool, que desapareceu para o deserto a propósito de ir comprar tabaco (só um português poderia chegar a marrocos com o pretexto dos cigarros). Conheço por excesso pessoas da minha terra, do meu bairro, da minha vida que deram de fuga. Foram para madrid, foram para londres, foram para boston, foram por onde as estradas do mundo esquecem o seu destino. E o que não me falta de gente em trânsito é gente que foi para o brasil, claro. Mas também para a argentina. Para o chile. Para a venezuela(!). A diáspora é de tal forma o quinto império deste meu bom povo que de portugueses está o mundo repleto. A acontecer, num determinado momento, num qualquer lugar tirado à sorte pela lotaria dos deuses, um desastre grande ou um supremo momento de júbilo, estará lá - asseguro-vos - pelo menos um tuga por testemunha! Kuala lumpur, nairobi, cidade do méxico, genebra, copenhaga, cairo, kathmandu. Não interessa a toponimia, há-de por deus encontrar-se por lá um zé, um antónio, um francisco e, com toda a certeza, uma maria. A verdade é que o português não gosta de Portugal. É até alérgico: porque raio de amor à pátria vai o Vasco contra ventos e correntes, contra a lógica e o bom senso, inventar um caminho marítimo para a índia? Porque, convenhamos, devia já estar fartinho de Portugal. Como Eça de Queiroz (ele próprio um diplomata), os portugueses acham que o seu país é mal frequentado e doentio. Os que partem sentem-se melhor, os que ficam são condenados aos serviços públicos de saúde, o que também não é nada bom. Reparem: eu conheço portugueses que preferem morar em nova deli. Que defendem a gastronomia de manchester. Que movem influências por um emprego do outro lado do mundo, o mais distante que seja possível por cartografia, o mais antípoda que poderá permitir a ciência geográfica e a criatividade do emigrante. É preciso sair daqui. A todo o custo. Qualquer lugar obscuro e suspeito, qualquer bocado de terra infernal e selvagem, qualquer quimera de supermercado serve de combustível ao motor desta incontornável, permanente e obsessiva volição.
Um dia destes fico para aqui sózinho.