segunda-feira, agosto 29, 2011

Há um buraco no céu.


Há um buraco no tempo e eu entro.
Há um paradoxo pela memória adentro,
Um negativo inverso que se faz tarde e eu vou.
Há um epicírculo, um centro, um vórtice que se fechou,
Por onde o vácuo se esgota e a morte se dissemina.
Há um buraco escancarado na consciência assassina,
Um autismo elíptico, sinusoidal, genomático,
Um síndroma celular de gatilho automático,
Uma singularidade voraz, uma convocatória,
Uma doença de cadáveres na peste fotográfica da história.
Olho lá para o fundo e afundo-me:
É ao diabo que dedico esta dedicatória.
Regresso ao inferno com febre de me perder,
Dou-me para ser esquecido e esqueço-me de me esquecer.
Há um buraco no céu com rugas de sangue e eu entro e eu sou
Esse apocalipse que me chama para onde estou,
De volta e sem retorno, de vez e eu vou.

Há um buraco no céu e eu entro,
Há um paradoxo pela memória adentro.
Há um vórtice que me devora e a vertigem cresceu.
Há um buraco anti-matéria na súplica de Orpheu,
Um fantasma anónimo que desapareceu.
Há uma fonte que secou e não sei de que nascente nasceu.
Há uma súbita ausência de tudo o que aconteceu.
Há um um iato, um silêncio, um vazio redondo no estrondo que se deu,
Há um poço sem fundo no fim do mundo,
Há um buraco sem véu nas velas do céu,
Há um vento que beija o deserto que ardeu,
Há tanto para ganhar como o que se perdeu
E eu já não sei se a vida que existe é a vingança de Prometeu
Ou uma cratera lunar no azul que amanheceu.
Há um buraco no céu e a alegria morreu
E a alegria morreu.