segunda-feira, fevereiro 24, 2014
O vilão é o Czar.
Ao contrário dos europeus, que odeiam a Europa, os ucranianos sabem bem que o modelo ocidental tem as suas vantagens e, entre o sempre eterno czarismo russo (há coisas que nunca mudam) e a disfuncional União Europeia, sentem-se mais inclinados para um modelo que, mesmo esquizofrénico e complexado, não entra com tanques nem exagera nos tiques autoritários.
A Ucrânia é uma potência regional, rica em recursos naturais e humanos, e os ucranianos, que constituem 78% da população do seu país (o resto são russos), sabem de História e sabem bem o que é melhor para a sua nação. Já nós, que não sabemos nadinha nem de história nem do que é melhor para a tosse, cumprimos o mesmo ritual masoquista de sempre com editoriais a desfazer na União, em vez de constatar o óbvio: a vocação imperialista de Putin sofreu, nos últimos dias, uma enorme derrota. E uma derrota alicerçada em valores que são caros ao Ocidente, porque os ucranianos não querem para eles o nepotismo, a oligarquia, a tirania, a miséria, a censura e a corrupção que faz a felicidade dos russos. Os ucranianos querem um sistema de estado de direito, democrático e que garanta níveis mínimos de mobilidade social e equidade económica, como aquele que faz infelizes os europeus.
A esquerda europeia (que constitui, afinal, 90% da opinião impressa) tem uma secreta e meio envergonhada admiração pelo Czar, e celebra as suas vitórias com euforia mal disfarçada (como aconteceu com o triste episódio sírio), mas cala invariavelmente as suas humilhações. A Putin tudo é permitido, vá-se lá saber porquê. Os maus da fita são sempre os imbecis da Comissão Europeia. Os imbecis da Comissão Europeia são de facto bastante imbecis, mas, que raio, a idiotia nem sempre é uma vilania e, neste caso, o mau da fita não pode ser Durão Barroso. Neste caso, como em tantos outros em que é poupado pela autofagia europeia, o vilão é Vladimir Putin.
O percurso da revolução ucraniana não acaba aqui e o mais provável é que o Kremlin consiga criar um pequeno estado fantoche com os russos do leste da Ucrânia, mas o simples facto de um povo ser forte o suficiente para fazer frente às ambições do Czar é, nos tempos que correm, um sinal de que a civilização ainda tem argumentos na eterna batalha contra a barbárie.