quarta-feira, fevereiro 18, 2015
Só para quem gosta de corridas.
Ron Howard é um cineasta absolutamente imprevísivel, que está sempre a oscilar entre a competência e a mediocridade. É tão capaz de realizar objectos fílmicos decentes e com peso na cultura pop contemporânea, como Apollo 13, Frost/Nixon, Cinderella Man ou A Beautiful Mind, como de dirigir verdadeiros cataclismos do bom senso e do bom gosto, como Far And Way, Backdraft ou o lamentável Da Vinci Code (é difícil fazer de Tom Hanks um actor medíocre, mas Ron Howard conseguiu cumprir a desgraça).
Por sorte, em Rush, uma espécie de biopic dedicada à célebre rivalidade entre Nikki Lauda e James Hunt, Ron mostra o seu melhor lado. Para quem gosta de corridas de automóveis, das boas e velhas corridas de automóveis, o filme enche as medidas e mata muitas saudades. É que a acção centra-se no ano paleolítico de 1976, altura em que a Fórmula 1 era um espectáculo operático de alta intensidade ontológica e antológica, que colocava na arena uns monolugares monstruosos, completamente analógicos, que faziam um barulho do escafandro, gastavam que nem doidos e assassinavam recorrentemente os seus domesticadores. Lauda e Hunt eram excelentes domesticadores. E enquanto o inglês escapou incólume da aventura, o austríaco pagou caro pela glória, como toda a gente sabe. Howard conta a história com desenvoltura técnica (a coerência estética e dinâmica entre as sequências digitais e a imagem real é um ponto forte da fita), sentido épico e fluência dramática, os actores são convincentes na transfiguração, e a história é, na sua maior parte, contada como aconteceu realmente, o que é raro num filme produzido pela máquina de debitar mentiras que é Hollywood e de que Ron Howard, para o bem e para o mal, é indefectível campeão.
Já quem não gosta assim tanto de automobilismo, se calhar o melhor é ver as cinquenta sombras de grey ou uma outra merda qualquer.