terça-feira, abril 21, 2015

A culpa e os afogados.

Há já umas boas décadas para cá que o Mediterrâneo afoga homens e sonhos com uma voracidade arrepiante. Desgraçados do Magreb, refugiados do Médio Oriente, expoliados do Sudeste Africano e infelizes de toda a parte acabam por sucumbir ao falso pacifismo deste mar intestino e denso, carregado de ódios. Metem-se aos magotes em jangadas impensáveis e em porões sobrelotados na vaga expectativa de uma promessa de liberdade e prosperidade que a Europa, lamentavelmente, já não está em condições de cumprir.
Mas este facto - o do velho continente não ter condições materiais nem políticas nem sociais para receber esta gente inúmera de braços abertos - não pode servir para transferir a responsabilidade da tragédia para os ombros do Ocidente, como têm estado a fazer certos imbecis como Loris De Filippi ou António Guterres.
Não, por Deus, a culpa não é nossa. Se os desgraçados, os refugiados, os expoliados, os perseguidos, os esfomeados e os infelizes de toda a parte naufragam abundantemente nas rotas de Ulisses, a culpa só pode ser originária dos países vilões e das organizações bandidas que os desgraçam, que os expoliam, que os perseguem, que os deixam à fome e que os fazem infelizes ao ponto de preferirem morrer afogados do que permanecerem nas suas terras.
A Europa não tem culpa que os senhores do Estados Islâmico façam aquilo que fazem. A Europa não tem culpa que os rapazes do Boko Haram façam aquilo que fazem. A Europa não tem culpa da guerra na Síria, na Líbia, na Somália, na Eritreia. A Europa não tem culpa da miséria no Mali, da fome no Sudão, do caos na Algéria e da corrupção no Egipto. A Europa não tem culpa que estados disfuncionais e draconianos atirem com os seus cidadãos para a morte certa. Não, não, não. Não somos nós os culpados.