Talvez batendo um recorde histórico de má educação, de má diplomacia e de absoluta arrogância, Marcelo Rebelo de Sousa informou Donald Trump que Cristiano Ronaldo nunca poderá ser presidente da República porque Portugal não é uma pocilga populista como os Estados Unidos da América.
Marcelo Rebelo de Sousa, que ainda ontem pulava e cantava alegremente num palco do Rock In Rio; Marcelo Rebelo de Sousa, o rei da selfie, a atracção turística de S. Bento, o comentador oficial dos jogos da Selecção; Marcelo Rebelo de Sousa, o bombeiro, o entertainer, o homem ubíquo que está em toda a parte e em todos os momentos; o Presidente dos afectos e das multidões, dos beijinhos e dos abraços; Marcelo Rebelo de Sousa, o social democrata que patrocina e sustenta alianças de regime de extrema esquerda; Marcelo Rebelo de Sousa que chegou a Presidente da República depois de décadas a chafurdar na infâmia do comentário cínico e para-ideológico num programa de televisão; o mais populista de todos os chefes de estado das três repúblicas que desgraçadamente se sucederam às desgraçadas dinastias monárquicas; este Marcelo Rebelo de Sousa recusa a hipótese de um jogador da bola ascender ao poder político porque Portugal é um sítio respeitável, habitado por um povo esclarecido que elege apenas grandes e sérios estadistas para os altos cargos da Nação, personagens impolutos como José Sócrates, Manuel Pinho, Duarte Lima, Miguel Relvas, Avelino Ferreira Torres, Valentim Loureiro, Isaltino Morais, Armando Vara, Filipe Meneses ou Dias Loureiro; gente de máxima competência técnica e política como Pedro Santana Lopes, António Guterres, Fernando Nogueira, Maria de Lurdes Pintassilgo, Fernando Gomes, Constança Urbano de Sousa ou Brandão Rodrigues; pessoas de bem e que convivem bem com um regime democrático ocidental como António Costa, Catarina Martins e Jerónimo de Sousa (detenho-me neste excelente triunvirato para não cair na tentação da enumeração exaustiva).
Marcelo Rebelo de Sousa tem razão, mas ao contrário: Portugal de facto não é como os Estados Unidos da América. Portugal é um país completamente insignificante, uma república completamente falhada (por três vezes falhada), dirigida por uma oligarquia medíocre e corrupta, com uma economia formal e informalmente nacionalizada, frágil e dependente do crédito internacional. Os Estados Unidos da América são a maior potência mundial, talvez o maior dos impérios da história da humanidade (se bem que se trate de um império de influência - não territorial), a mais poderosa máquina económica de sempre e - sobretudo - a mais bem sucedida democracia desde que Sólon reformou o sistema político de Atenas. Comparar a democracia americana com a portuguesa terá sempre que ser, para nós portugueses, um exercício extremo de humildade radical, para não dizer outra coisa.
Marcelo Rebelo de Sousa, o presidentezinho hiper-populista de um país obscuro e marginal (de um país reconhecido mundialmente por um rapaz que tem algum jeito para dar pontapés numa bola), que ainda assim estava todo contente por ser recebido na Casa Branca, que ainda assim não escondia a sua vontade indomável de aproveitar convenientemente os 15 minutos de fama que a administração Trump, sabe-se lá porque raio de boa vontade, lhe decidiu conceder, devia ter ficado calado. E calado da forma mais silenciosa que é possível a um ser humano.