terça-feira, maio 28, 2019

Much ado about nothing.

Políticos e jornalistas e comentadores de toda a selvagem espécie fizeram uma festa de arromba, a propósito das eleições para o Parlamento Europeu. Que esta inútil e impotente assembleia constitua apenas a prova provada que a União Europeia não é uma democracia, não lhes reduziu o ânimo lúdico. Que na verdade ninguém os estivesse a ouvir, também não lhes pareceu uma variável pertinente. São turbas festivaleiras, em negação. E fizeram o festival na mesma, como se nada fosse. Na altura de disparar o fogo de artifício, não pesou o pesado facto de que apenas 31,3% dos eleitores registados terem perdido um tempinho para ir votar no mais inútil dos organismos eleitos desde que Cícero entregou o Senado a Júlio César.

Uma república que vive com este nível de abstencionismo, é uma anedota, claro; uma trágica comédia de enganos. Se retirarmos os militantes dos partidos que foram a votos (só o PS registava até há bem pouco tempo 120.000), bem como os civis que vivem à conta dos partidos ou do regime, o que é a mesma coisa, chegamos rapidamente à conclusão que muito poucos cidadãos nacionais estavam interessados nesta eleição. E se subtrairmos ainda os que votaram em partidos anti-europeístas, concluímos com algum acerto matemático que os portugueses que acreditam seriamente na União Europeia, tão seriamente que perderam 15 minutos para ir votar, devem ser não mais que um milhão, num universo de 8,5 milhões de eleitores.

A ausência de uma ideia original que fosse também deve ter contribuído para desertificar as assembleias de voto. Dou um exemplo: o bom do Nuno Melo achou que o melhor slogan que podia colocar, para sublinhar a sua carinha laroca nos outdoors 8x3 que poluem loucamente o horizonte urbano nestas épocas eleitorais, foi "A Europa é Aqui". A sério? É mesmo aqui? Uau, é espectacular essa localização da Europa. E então? E não há um jornalista que pergunte ao bom do Nuno: ok, ok, a Europa é aqui, sim senhor. Mas de que Europa é que estás a falar? Da Europa de Angela Merkel ou da Europa de Helmut Kohl? Da Europa de fronteiras abertas ou fechadas ou mais ou menos? Da Europa fascista, censora, alienada, dividida? Da Europa das elites burocráticas que normalizam comportamentos, policiam o pensamento, alteram e adulteram as culturas nacionais? Da Europa que traz desenvolvimento infra-estrutural ou da Europa que legisla sem mandato? Da Europa que tem impedido a guerra ou da Europa que transformou Paris numa barricada?

O problema é que estas não são matérias apelativas para as luminárias do circo mediático e as oligarquias estadistas. O que pretendem descaradamente é despir tudo de significado e ficarmos só com a farra pela farra. O que interessa é fazer render a feira, manter o rei nú, mesmo que toda a gente já tenha percebido há muito tempo que sua majestade traz as partes à mostra. The show must go on.

O que não faria Shakespeare com este espectáculo decadente.