terça-feira, maio 05, 2020

Haikus da Quarentena.



Fechado em casa.
Até as paredes estão fartas
de mim.



A civilização é frágil
como um formigueiro no caminho
do tractor.



Ruas desertas.
Só o silêncio
e o medo.



Quem preza mais a segurança
do que a liberdade
nunca esteve preso.



Não há pior silêncio
que o de um cobarde.



As multidões obedecem.
Deve ser por isso que na História
a ditadura é tão comum.



A mosca morta rodopia
pela minha cela.
Condenados os dois.


 
Quarentena placebo.
Não purga
nem cura.



Quarentena cruel:
obriga famílias
a quatro paredes.



Confino o meu corpo,
mas não a minha
voz.



Distância social.
Outra maneira de dizer
apocalipse.



Os melros fazem mais barulho
que a Segunda Circular.



Quando um dia fores
à procura do tempo perdido,
vais um dia
tarde demais.



Os meus clientes não existem.
Literalmente.



Eu fico em casa.
Mas o jardineiro, com a sua metralhadora de aparo,
não.



Não há nada
de bom
no fascismo.



Um imenso carnaval:
para onde te viras
vês pessoas mascaradas.



Até os cães estão fartinhos
de me aturar.



Quantos mortos vale uma ideia
de liberdade?



Uma definição de inferno:
Hollywood confunde-se
com a realidade.



A Netflix vive agora
no espaço ontem ocupado
pelo café do meu bairro.



Depois de décadas de trabalho duro,
percebes que és ingénuo.



Viver é correr riscos.
Só na campa há segurança.



Depois da afonia urbana,
a baía barulhenta.
O Atlântico tem o volume no máximo.