Passei as últimas semanas a deitar abaixo os jogos de Tóquio, e não sem eloquentes razões. Mas tenho que abrir um parêntesis na maledicência para fazer justiça a um momento verdadeiramente olímpico: a final dos 400 metros barreiras. O norueguês Karsten Warholm interpretou, a 3 de Agosto, um dos mais épicos feitos da história do atletismo, batendo o recorde mundial da prova, que já era sua propriedade, por 7.6 décimos de segundo. Ora, 7.6 décimos, numa prova de 400 metros barreiras, é uma verdadeira eternidade e dizem os entendidos que esta marca seria projectável a 30 ou 40 anos. Mas impensável agora.
Para dar contexto ao feito de Warholm será talvez pertinente dizer que os 45''94 que lhe deram o ouro, serviam para ganhar a prova de 400 metros sem barreiras de apuramento para os Jogos Olímpicos no Reino Unido (!). Ou que o segundo classificado e directo rival do norueguês nesta fabulástica final, o americano Rai Benjamin, bateu também o antigo recorde do mundo, cumprindo a incrível, mas insuficiente, marca de 46.17. Ou que Abderrahman Sambakin, que terminou em quinto lugar com o registo de 47.12 teria com esta marca vencido as últimas 6 finais olímpicas.
Não é preciso gostar de atletismo para ficar arrepiado com esta corrida. Karsten Warholm executa todos os centímetros da prova com sobre-humana perfeição técnica, mas os últimos 50 metros são verdadeiramente belos e de uma intensidade clássica, que transporta o seu esforço para o plano mítico.
Assim, sim.