Durante algumas décadas, o conceito de Matéria Negra serviu bem para explicar alguns fenómenos observáveis no universo que eram dificilmente compreensíveis sem ela. Se nos limitarmos à matéria observável e cuja constituição dominamos, rapidamente percebemos que o universo é mais pesado do que seria expectável, os clusters galácticos movimentam-se demasiado depressa em relação ao seu centro, a luz das galáxias é mais distorcida do que seria de supor, o espectro energético da radiação cósmica de fundo é mais intenso do que devia ser e a matéria cósmica é mais densa do que seria plausível. Se incluirmos porém a Matéria Negra na grande equação de tudo, essas excentricidades tornam-se afinal triviais, isto embora ninguém saiba na verdade o que ela é e de que é constituída. Os físicos contentaram-se porém com a incerta certeza de que a matéria negra existe, e está lá para tornar o cosmos um pouco mais domesticado.
O problema é que nos últimos anos os astrónomos detectaram novos comportamentos siderais que contrariam as previsões implícitas na Matéria Negra: ausência de picos de densidade nos núcleos de pequenas galáxias, escasso número de galáxias satélites (sendo que as que existem respeitam alinhamentos que a Matéria Negra também não explica), colisões a altas velocidades entre clusters de galáxias, e outras dissonâncias deste género que têm descredibilizado a Matéria Negra como uma solução simples, embora enigmática, para o muito que não sabemos sobre o cosmos.
Curiosamente, a Gravidade Modificada, uma teoria que parte do princípio que a Lei de Newton está mal formulada, resolve muitas das anomalias que a Matéria Negra não soluciona. Isto embora seja imprestável para justificar os fenómenos a que a Matéria Negra dá boa resposta.
Acontece porém, e chegámos finalmente à parte gira desta conversa, que enquanto a Matéria Negra indexa, talvez, à física das partículas, a Gravidade Modificada refere-se à física ondulatória. E como é sabido, em Mecânica Quântica aquilo que agora é uma partícula pode rapidamente ser uma onda e vice-versa. Neste contexto, é apenas natural desconfiar que, se calhar, a Matéria Negra e a Gravidade Modificada são duas faces da mesma moeda. Em certas situações ou em certas localidades do universo, a matéria comporta-se como se fosse constituída por partículas. Noutras geografias e noutros contextos, comporta-se como uma onda. Poderá assim existir a possibilidade desse comportamento dual funcionar sob uma mesma equação ou obedecer a uma lei apenas.
Tudo isto em teoria, claro. Na verdade, tanto a Matéria Negra como a Gravidade Modificada são axiomas altamente especulativos, que se adaptam a algumas observações e a outras não. Que servem a alguns cálculos e a outros não. Sabine Hossenfelder, que não é conhecida por dar livre rédea à especulação, considera porém que a questão merece investimento. E propõe uma abordagem multidisciplinar, de forma a explorar o seu potencial. Boa sorte.