sábado, dezembro 18, 2021

James Webb Space Telescope: se tudo correr bem, vamos ver melhor.

Toda a gente que se interessa por astronomia sabe que o Hubble, telescópio orbital responsável pelas mais profícuas, bonitas e populares imagens do universo alguma vez captadas, teve um percalço inicial: quando colocado em funcionamento, os cientistas responsáveis pelo projecto tiveram ataques cardíacos em catadupa, já que o sagrado objecto parecia sofrier de estigmatismo e tudo o que podia fazer era captar imagens desfocadas. Por causa de um erro no ângulo de curvatura numa das lentes, o Hubble esteve em perigio de ser abandonado no espaço à sua inutilidade, mas acabou por ser arranjado e funcionar como se sabe, apesar do acréscimo de custos inerentes a uma missão do Space Shuttle que por lá passou e lhe instalou uma espécie de lentes de contacto, que resolveram lindamente o problema oftalmológico.

Ora, o risco de que algo semelhante aconteça ao Webb Space Telescope, o projecto da NASA para substituir o "velhinho" Hubble que vai custar cerca de dez biliões de dólares e que será lançado dentro de cinco dias, é bastante alto. Trata-se do telescópio mais poderoso da história da humanidade, o maior que já foi alguma vez colocado em órbita, e um dos projetos de engenharia mais complexos e ambiciosos já tentados, destinado a testemunhar o nascimento de estrelas e galáxias nos limites observáveis do espaço-tempo e sondar planetas alienígenas em busca de sinais de vida.

The assembled telescope stands tall with its mirror folded at Northrop Grumman’s facility in California.

Só o facto de ter que se dobrar para caber no foguetão onde vai ser transportado (o telescópio é do tamanho de uma casa) e depois já em órbita ter que desdobrar dezenas de instrumentos delicados e sensíveis, em condições hostis, já tira o sono aos responsáveis pelo projecto. O intrincado processo, constituído por centenas de passos necessários para que o telescópio entre em operação, vai durar seis meses (!).

Além disso, os materiais que permitem que o gigante seja leve o suficiente para ser transportado para o espaço são do tipo orgânico, como tecidos, cujo comportamento não determinístico dificulta imenso a previsão e o controlo do comportamento dos mecanismos.



Mas, se tudo correr bem, valerá a pena esperar porque o James Webb consegue eliminar grande parte dos infravermelhos irradiados pelo universo, bem como a luz do Sol, da Terra e da Lua, de forma a que as lentes trabalhem numa santa escuridão e a baixas temperaturas. Desta forma, será possível captar imagens mais nítidas de objectos distantes, tão distantes como as primeiras estrelas e galáxias que nasceram depois do Big Bang, analisar a composição química das atmosferas de planetas exógenos, medir com mais rigor a velocidade a que o universo se expande e assistir à génese de todo o tipo de fenómenos siderais que até agora eram impossíveis ou muito difíceis de observar.

Há muita gente que vai roer as unhas até aos cotovelos, nos próximos meses. E considerando o registo catastrófico da NASA nos últimos anos, o desastre não surpreenderia ninguém. Mas é impossível não torcer para que o Telescópio James Webb vença a entropia e funcione na perfeição. As imagens que está teoricamente preparado para captar podem revolucionar a cosmologia contemporânea e refundar paradigmas sobre a natureza do universo, a sua escala, a sua idade, o seu movimento. Para além, claro, da prometida beleza espantosa dos bonecos que vai com certeza produzir.

A ver vamos.

Mais sobre o James Webb Space Telescope, na Quanta.