Ainda ontem escrevia sobre os cenários de guerra na Ucrânia, quando entretanto a mais irrealista das circunstâncias acontece: uma tentativa de golpe de estado na Rússia.
Já há uns meses largos (desde a batalha de Bakhmut, parar sermos exactos), que o Grupo Wagner, um verdadeiro exército privado russo, liderado por Evgeny Prigozhin, se posicionava como um contrapoder em relação à hierarquia estabelecida do regime e ontem à noite as coisas ensandeceram. As forças do Wagner tomaram aparentemente a cidade de Rostov e dirigem-se agora para Moscovo.
Wagner at the Southern Military District HQ in Rostov. Welp. pic.twitter.com/vMKptZO43F
— Russians With Attitude (@RWApodcast) June 24, 2023
Há muita desinformação a correr nas redes sociais e nem vale a pena falar do que a imprensa corporativa noticia sobre o assunto, claro, porque são nove mentiras em cada dez parágrafos. Scott Ritter, que está sempre muito bem informado, diz-nos que:
- A tentativa de golpe de estado é real e séria e o Grupo Wagner tem ao seu dispor cerca de 30.000 efectivos, bem armados e treinados.
- O movimento está a ser manipulado, muito provavelmente, pelos serviços secretos britânicos. Não é segredo para ninguém que o bloco ocidental tem como objectivo último a queda de Vladimir Putin e do seu regime.
- Vladimir Putin já deu ordem para que a revolta seja esmagada, e carta verde para que sejam usados todos os meios necessários. Tropas de elite foram destacadas para o efeito.
- As forças do Grupo Wagner já enfrentaram bombardeamentos pela força aérea russa, no seu trânsito para Moscovo.
- Há relatos de que forças militares leais ao regime estão a ocupar pontos estratégicos em Moscovo e Rostov.
- Os rebeldes não parecem, pelo menos por agora, recolher apoio popular. Ou das forças armadas russas.
- Valdimir Putin falou ontem à noite à nação, acusando os amotinados de traição à pátria e prometendo que tudo faria para restabelecer a ordem, recordando o episódio histórico de 1917, quando a rebelião contra o regime dos czares começou precisamente nas trincheiras do exército russo, situação que conduziu a uma guerra civil e que teve como resultado, dois anos depois, o triunfo dos bolcheviques.
- Ao contrário de relatórios que circulam nos media, Putin não fugiu para S. Petersburgo e permanece em Moscovo.
Sem apoio popular e de outros sectores das forças armadas russas, que até agora não se registou, será difícil a Evgeny Prigozhin levar este golpe de estado a bom termo. Eu arrisco projectar que o líder do Grupo Wagner escapará para o Ocidente assim que as coisas comecem a correr mal. Considerando o intenso nível de psyops a que assistimos desde que a guerra na Ucrânia começou, não ficaria sequer surpreso que esta operação tenha sido desencadeada apenas com a intenção de distrair as atenções sobre o falhanço da ofensiva ucraniana, desgastar animicamente o regime de Putin e denegrir a sua imagem a nível internacional.