Este prístino documento sobre uma batalha tribal na Papua Ocidental, em 1963, que já revisitei várias vezes, deixa-me sempre perturbado. As imagens, grotescas, de uma guerra que parece fictícia, encenada, ritual, mas que na verdade não podem ser mais realistas, estão carregadas de um qualquer elemento de malignidade humana que não consigo descrever, mas que é quase palpável.
Ao contrário do que a literatura clássica, ou a novelesca moderna de Hollywwod nos diz sobre a guerra, não há aqui heróis, nem movimentos épicos, mas apenas seres humanos movidos por uma ancestral vontade de se combaterem, que oscila entre o medo, a auto-preservação e o ódio pelo outro.
Perturbam-me especialmente as expressões faciais dos guerreiros, tão sérias que são solenes, mesmo nas crianças, que aprendem a arte bélica no mesmo campo de batalha em que os seus pais combatem, num exercício pedagógico de máximo niilismo.
Vejo e revejo este documento sempre na expectativa de descortinar o mistério da condição humana. Sempre em busca do que nos move uns contra os outros, nessa vã tentativa de saciar a sede de sangue com que todos nascemos e que nunca chegamos a aplacar.
Desconfio que estas imagens escondem a verdade sobre a minha própria natureza. Mas não consigo chegar lá. Fico apenas paralisado pelo espanto, a repulsa, o assombro.
Eu sou isto. Quem sou eu?