domingo, novembro 09, 2025

Das religiões ateístas ou breves reflexões sobre assuntos deveras complicados, que terão que ser aprofundados com mais vagar.

Não deixa de ser trágico-cómico que, desde o iluminismo, os cientistas persigam obsessivamente o conhecimento sobre as leis que regem o cosmos, enquanto rejeitam com crescente fanatismo a ideia de um legislador que as tenha criado.

A circunstância é tão absurda como a de um conjunto de juristas que dediquem a vida ao estudo de um qualquer código civil, na crença irredutível que o documento foi criado por ninguém, fruto aleatório e anónimo do acaso e da necessidade.

Há até alguns académicos que defendem a ideia de que o universo é produto de uma espécie de código de software, enquanto juram a pés juntos a inexistência de um programador.

Ou seja: é preciso ser bastante religioso para não acreditar em Deus. 

Mas a mais abstrusa das religiões ateístas, parece-me, será o budismo, na medida em que experimenta o transcendentalismo, sem ter nada de transcendental que venerar. 

O budismo procura a "iluminação", assume que o processo pode demorar vidas inteiras, sucessivas, reencarnadas ad aeternum, para ser conseguido, só para que se descubra no estatisticamente improvável desfecho uma certa banalidade, que está para além do comum entendimento humano.

Mas até os iluminados, que são mesmo um punhado de muito poucos seres humanos na proporção de toda a gente que já foi parida na história universal, não conseguem explicar lá muito bem aos não iluminados, que maravilhas banais são essas que eles conseguem perceber e nós não.

Por outro lado, o taoismo, outra religião ateísta, ou é altamente supersticioso, e não interessa a ninguém que tenha nascido depois do século XVIII, ou é puramente filosófico e, nesse sentido, válido. Tão válido como o estoicismo, por exemplo.

Mas a taoistas e estoicos continua invariavelmente a fazer falta uma justificação para a criação. 

É por isso que estoicos mais astutos e tardios, como Marco Aurélio, especulavam sobre uma força criadora. 

Porque a existência desse demiurgo estipula necessariamente as regras do jogo. As que se relacionam com a física, e as que se relacionam com a moral.

E é por isso que eu digo que Marco Aurélio foi cristão antes de Cristo.

Seja como for, isto são ideias avulsas e necessariamente curtas. Eu tenho andado a ler umas coisa sobre taoismo e budismo e hei-de escrever mais aprofundadamente sobre o assunto quando para aí estiver virado e tiver vagar, que é coisa que me falta, neste momento.