quarta-feira, abril 05, 2006

De quotas e equívocos.

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O meu amiguinho Shark predispôs-se atenciosamente a pegar num excerto do que eu aqui escrevi sobre a questão das quotas de acesso aos cargos partidários para dissertar sobre o assunto, o que me apraz deveras, apesar das desavenças de opinião, já que o meu interlocutor se acha hesitante na sua superior equação do caso.
Bom, não que tenha maluca paixão por polémicas, não que entenda que os meus amigos devem pensar politicamente como eu seja sobre o que for, mas por todos os deuses da individualidade humana, acho pertinaz esclarecer certas minudências, a saber:

a) Não tenho qualquer dúvida que as mulheres têm capacidade mais que bastante para cumprir tão bem ou melhor que os homens qualquer tarefa do âmbito político ou público. Ao invés, desconfio imenso da nossa capacidade para levar a cabo algumas muitas das missões que a mãe natureza (essa santa mulher de competências indiscutíveis) escolheu para atribuir ao género feminino. A minha oposição a esta coisa maluca de se obrigar a mulher a cumprir um determinado papel (sem se perceber bem se esta o deseja ou não) está explicada num post que escrevi em Outubro de 2005 e que, a certo momento, rezava assim:

Em vez da discriminação positiva, da gramática revisionista e do moralismo abjecto e arcaico das comunas de Paris, o que se deve dar às mulheres são direitos e oportunidades iguais. Ponto final. Tudo o mais é lamechice insuportável, ou pior ainda, tudo o mais é querer tranformá-las. É querer alterar a sua antropologia. Tudo o mais é que é ser paternalista, fascizóide, segregacionista. Tudo o mais é não perceber coisa nenhuma de biologia, é não saber aceitar que homem e mulher cumprem papeis diferentes no quadro da mecânica natural da sua espécie. É não conseguir compreender que o Homo Sapiens é um produto relativamente bem sucedido dessas diferenças simbióticas, dessa multiplicidade diversa, que também é responsável pelo género que têm as palavras, tanto como pela ordem semântica da linguagem. Tudo o mais é querer transformar mulheres em homens.

b) Podemos bem percorrer a história do sapiens com zelo enciclopedista que só encontramos uma evidência: sendo a política a ciência da obtenção e manutenção do poder social, o conceito que traz atachado é substantivamente masculino. A questão, porém, é de ordem antropológica: o animal humano escolheu diferentes formas de assegurar a sobrevivência através dos seus modelos de organização social e política, que não são decorrentes da abstracção dos filósofos nem da crueldade dos revolucionários. Se exceptuarmos 3 ou 4 obscuros casos conhecidos e devidamente estudados, mesmo nas sociedades matriciais o exercício do poder - e da guerra - decorre da ambição, da pulsão predadora, da sede de conquista do sapiens macho.

c) No seu texto, o Shark fala das disparidades e injustiças que ocorrem não tanto nos centros urbanos do país, mas sobretudo no interior. Este argumento, porém, parece ignorar que a esmagadora maioria dos quadros partidários nacionais provêm precisamente do litoral urbano (reflectindo naturalmente as estruturas sócio-demográficas) e que - de qualquer forma - muito pouco poderá a nova lei contra realidades biológicas, culturais, étnicas e históricas desta antiga raça humana e deste velho país Portugal. O ilustre blogger, justamente preocupado com o desperdício de mais uma geração de mulheres capazes, evita interrogar-se sobre a vontade das mulheres capazes desta geração, que até podem não ter desejo algum em demonstrar a sua valia nos palcos institucionais do governo da nação. Isto, independentemente de serem as raparigas o género estatisticamente dominador no país universitário (outro facto que o Shark prefere descartar). Hoje em dia, sejam homens, sejam mulheres, há pouca gente com juízo e inteligência que se queira dedicar à profissão. Basta olhar para o deprimente cenário humano das elites partidárias que temos. E além disto: uma mulher capaz não pode simplesmente preferir dedicar-se mais aos seus filhos e menos à servidão da causa pública?

d) O meu caro amigo disserta também sobre o handicap que a maternidade implica para a performance profissional das mulheres. Ora este facto, por felicidade rara, não pode mesmo ser alterado por decreto-lei. Até ver, são as mulheres que têm filhos. São também elas que os amamentam. E, quem sabe por essa mesma razão, são substancialmente elas que os amam, que os educam, que os guiam, que os protegem, que os entendem e que os aturam.
É verdade que a mulher se deixou governar pelo homem em 99% dos casos da história regimental das sociedades. Mas que hipóteses de sobrevivência teria um regime que lhe retirasse o direito de cuidar dos seus filhos? Eva sabe bem das suas prioridades e eu cá, que até não sou dotado de progenitura, acho que a maternidade, por deus, não é um handicap. A maternidade é, ao contrário, a mais sagrada missão que um ser humano pode realizar à superfície deste calhau. E bem vistas as coisas, são os homens que se podem queixar do respectivo criador, dada a suprema discriminação: o bicho Adão foi nitidamente condenado a tarefas menores.

e) Só para terminar, que já estou a esticar o post para além dos limites do suportável: o quadro mental e filosófico desta lei, insere-se num novo tipo de fascismo manipulador, quase eugénico, sobre as sociedades ocidentais, que é característico de uma certa esquerda europeia e que muito me desagrada. Como liberalzito perneta que sou, acho que não cabem ao legislador/aprendiz de feiticeiro a prossecução de certo tipo de engenharias, cuja complexidade e amplitude ontológica ele não dominará nunca.