quarta-feira, setembro 06, 2006

A biblioteca dos silêncios.

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Se há uma merdinha que me chateia à brava nisto de ter um blog, é a de não ter tempo - ou espírito - para escrever sobre tudo e mais alguma coisa. É uma vergonha ficar para aqui calado dias a fio com tanta cena desinteressante e desinteressada que me passa por esta cabeçorra cota, já um bocado afanada no juízo e na memória.
E se há falha grande nestes conteúdos bizarros do blogville, a primeira é de certeza esta triste: escreve-se aqui muito pouco sobre livros. Que chatice de blog onde se escreve tão pouco sobre livros. Mas, caramba, que vos hei-de dizer eu, alma ociosa e ignorante, sobre Edward Gibbon? De que vos posso falar se estiver para aqui a falar do Mediterrâneo segundo Braudel ou do Tempo segundo Proust? Como posso eu, mesmo que num momento de raro esclarecimento, explicar a glória da História Universal da Infâmia? Alguma sugestão? Que palavras podem ser usadas para comentar a verdadeira Obra ao Branco que é esta mulher a quem chamavam Marguerite Yourcenar (a única belga com um lugar na história)? Sim, expliquem-me por favor como é que é isto de esgalhar um post sobre Os Doze Césares (já tentei e desisti) ou sobre As Origens Sociais da Ditadura e da Democracia, ou até, de forma mais descontraída, sobre O Vermelho e o Negro do meu querido Stendhal, sobre o Cândido do meu amado Voltaire ou o Memorial do Convento do canalha do Saramago.
É muito complicado para mim, que escrevo sobre quase tudo aquilo em que sou iletrado, escrever sobre a minha ileteracia e não é por ter lido e sonhado com o Admirável Mundo Novo, com o regresso de Ulisses, com o delírio em tempo real de Joyce, com os relatos mercenários de Cícero ou com as rimas de Dylan Thomas que deixo de ser valentemente ignorante.
Eu lamento imenso, mas é para mim muito difícil falar-vos de Álvaro de Campos. Outrossim de Walt Whitman. É deprimente, mas não sou audaz quanto baste para despejar umas certezas sobre a literatura russa, o teatro isabelino, a grande novela anglosaxónica e o estranhíssimo comunismo místico do romance sul-americano.
Serei sempre incapaz de vos aborrecer com aquilo que possa considerar sobre o génio paneleiro de Oscar Wilde, a virtude de Somerset Maugham, o negro coração de Joseph Conrad, as aguarelas beatnick de Allen Ginsberg ou os manifestos do bravo do Almada. Não percebo sequer como é que alguém tem o desplante de fazer crítica sobre a obra de Nietzsche, de Bachelard, de Anaxágoras ou de Filo de Alexandria.
Pois é: não sou gajo para isto. O máximo que consigo é conversar. Até porque, sobre livros, podíamos muito simplesmente ficar a conversar durante a noite toda da vida. É deliciosamente mais irresponsável por causa de não haver registo e é muito mais divertido por conta dos copos.