A arte de perder não é de difícil mestria;
Há tantas coisas que parecem cheias de vontade
de se perderem que a sua perda não faz razia.
Aceita o incómodo de perder em cada dia
as chaves de casa, a hora que não deixa saudade.
A arte de perder não é de difícil mestria.
Depois procura perder, com mais alcance e energia,
os nomes, os lugares para onde talvez te agrade
viajar. Nada disto faz razia.
Perdi o relógio da minha mãe. E também a moradia,
última-ou-quase de três casas da minha afinidade.
A arte de perder não é de difícil mestria.
Perdi duas cidades amadas. E mais perdia;
alguns reinos meus, dois rios, uma tempestade.
Dei-lhes pela falta mas não pela razia.
Até perder-te (a tua voz, o teu gesto e a ironia
que amava) não devo ocultar - é de claridade:
a arte de perder não é de difícil mestria
mesmo quando parece fazer (di-lo!) fazer razia.