Estou à espera de uma invasão de extra-terrestres desde que era criança. Peço desculpa pela imodéstia mas esta velha expectativa só prova que não era uma criança completamente estúpida porque, 40 anos depois, a única solução para termos um ano novo melhor do que o anterior continua a ser precisamente uma invasão de homenzinhos cinzentos com mau feitio e fuscas de potência mega atómica e cheios de fome de carne humana. Submetida a raça sapiens à lógica da sobrevivência, começaríamos decerto por servir aos ávidos conquistadores uma entrada substancial com os radicais islâmicos de todo o planeta. Assim, entre a entrada e o prato principal, sempre tinhamos a oportunidade de apreciar as virtudes inumeráveis de viver num planeta sem radicais islâmicos.
2015 também podia trazer silêncio. Aquele género de silêncio tumular, aquela espécie de silêncio que é o mais silencioso possível, sem surdinas nem fugas; um silêncio-vento-divino para calar os que estão presos e os que mandam prender e os que estão soltos e os que mandam neles. Um silêncio higiénico que emudeça os banqueiros e muito especialmente os banqueiros que faliram. Um silêncio que una, numa épica e endémica concórdia, sindicalistas e patrões, juízes e advogados, ministros e cronistas, deputados e jornalistas, médicos e pacientes, professores e alunos, heróis e vilões, vítimas e agressores, crentes e ateus, santos e filhos da puta, todos juntos numa oração sem decibéis, orgíaca elegia do ruído zero.
Alegra-me a possibilidade bem real de que no próximo ciclo à volta do sol aconteçam coisas menos boas a gente menos recomendável como o sr. Abu Bakr al-Baghdadi, o sr. Mullah Mohammed Omar, o Sr. Ali Khamenei, o sr. Kim Jong-un, o sr. Vladimir Putin, o sr. Michel Platini, e - este é de estimação - o sr. Julian Assange.
Para me dar alguma satisfação aos dias, conto também com uma previsão auspiciosa, que calculo com a exactidão de um astrólogo de corte: vem aí um ano infernal para Barak Obama.
E outrossim para José Sócrates.
Tenho fé que em 2015, alguém, num gabinete obscuro de Princeton, descubra uma solução minimamente decente, minimamente elegante, para o Problema da Costante Cosmológica, mas alerto: esta fé é tão religiosa como aquela do Deus católico. Na verdade, a minha metafísica de ateu desconfia bem que o Problema da Costante Cosmológica não tem solução (o que deveras me escangalha qualquer tipo de optimismo no futuro).
Claro, era excelente que o ano novo prometesse menos impostos e mais uma arca a rebentar de poemas do Pessoa (devo confessar que desejo isto mais que a paz no mundo e o fim da fome), e também seria superiormente agradável que o Benfica fosse campeão nacional, mas como estes desejos conseguem ser mais irrealistas que a fé católica ou o Modelo Standard da Física das Partículas, é melhor parar por aqui.
É que, muito sinceramente, não estou com paciência alguma para um ano de excessos.