Como profissional de comunicação tenho a obrigação de saber que o medo
vende à brava. Mas desconfio que os jornais vão continuar a perder a
pouca audiência que têm se persistirem nesta esquizofrenia do Covid-19,
porque há limites para o alarmismo, mesmo que os tentemos esticar ao
máximo e as pessoas vão acabar por se aborrecer de serem constantemente
conduzidas ao pânico. Isto já para não falar na idiotia total: é de
grande utilidade ficarmos a saber que a primeira vítima mortal do Covid-19 em Portugal foi um senhor amigo de Jorge Jesus ou que o actor Idris Elba testou positivo, por exemplo.
Por uma vez na vida, os meios de comunicação social podiam tentar ser
imaginativos. Já que as pessoas vão inevitavelmente ter mais tempo do
que costumam (nem que seja pelas horas que poupam em deslocações para o
trabalho e para as escolas e nos afazeres diários que perderam o seu
sentido), talvez fosse boa ideia criar conteúdos alternativos, que captassem a atenção
e a sensibilidade dos leitores. Abrir suplementos relacionados com a história, as artes e as ciências; criar conteúdos sobre hobbies e outros
nichos de interesse; publicar ficção folhetinesca como muito bem se
fazia no fim do século XIX e princípio do Século XX em Portugal;
implementar uma filosofia editorial que abrisse espaço mediático para
personagens e fenómenos fora do mainstream; enfim, aproveitar
esta janela de oportunidade para reinventar a imprensa, mesmo com os
jornalistas a trabalhar em casa (ou precisamente por causa disso).
Mas não. Está tudo a carregar exclusivamente na mesma e deprimente tecla do susto. Como sempre. Que tristeza.