terça-feira, maio 12, 2020

A discoteca da minha vida: discos 6 a 10.

#6 - Saturday Night Fever - Vários

Sei bem que estou a colocar-me na posição óptima para ser gozado, mas este duplo álbum tem que constar da lista de discos fundamentais, porque é parte integrante do meu ritual de passagem da meninice para a adolescência. E convenhamos: se Saturday Night Fever – o filme - é uma merda sem nome que foi ruindo pelas décadas e é hoje não mais que um objecto da Arqueologia do Gosto Duvidoso, já a banda sonora, bom deus, é a mais garrida e espalhafatosa das obras, sinfonia multicolor que fez, faz e fará girar todas as bolas de espelhos da grande discoteca que é a imaginação acústica do ser humano.
Para além das imortais composições dos Bee Gees, capazes de abanar o esqueleto do mais empedernido bota de elástico – ou de derreter o coração de Átila – há toda uma miríade de fugas disco, umas mais pirosas que outras, mas todas gloriosamente gay, gloriosamente dançáveis, gloriosamente destinadas a ficarem gravadas no bocadinho da massa encefálica que presta atenção ao ritmo e às consequências do ritmo na triste figura de cada um.
Saturday Night Fever não é afinal uma banda sonora. É uma monumental explosão de confetis. Um triunfo de lantejoulas e strobs. A promessa fútil, mas idílica, de uma noite feliz, na pista de dança da juventude. E não, isto não é dizer pouco.






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#7 - High 'n' Dry - Def Leppard

Depois de eleger um disco para todos os públicos no último post desta série, alerto que este aqui é só para homens de barba rija: High 'n' Dry dos Def Leppard. É preciso não confundir este disco com os que se lhe seguiram, porque, com o estrelato, os Def Leppard perderam autenticidade e virtude, transformando-se numa banda de plástico, formatada para grandes audiências. Esta sinfonia de arame farpado, porém, é nua e crua e rude e impenitente como deve ser o rock, está cheia de riffs durinhos que só são possíveis de criar numa garagem mal cheirosa de Sheffield e transpira rebeldia em todas as estrias do vinil.
Grandiloquente e mal criado, High 'n' Dry não está preocupado com o que a tua namorada possa pensar: é a definição de um produto genuíno, francamente desalinhado entre o Heavy Metal e o Hard Rock, símbolo talvez máximo de uma estridente e extinta forma de fazer boa música. A banda sonora perfeita para um mergulho no concreto betão da piscina seca.





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#8 - 4 - Foreigner
 

1981. Os Foreigner, que já eram grandes nos mercados anglo-saxónicos, editam um círculo de policloreto que vai fazer explodir os amplificadores de todos os adolescentes em todos os cantos do universo. 
4 é um disco icónico por muitas razões: inclui o mais célebre solo de sax da história universal da cultura pop (em "Urgent"), é tremendamente lamechas enquanto debita electricidade como se fossemos todos ficar sem luz amanhã de manhã (em "Break It Up"), faz o elogio de si mesmo sem parecer gorduroso de vaidades (em "Juke Box Hero"), glorifica a mulher fatal como só Lauren Bacall conseguira até aí fazer (em "Woman in Black"), enquanto preenche todas as caixinhas da checklist que dá acesso ao Olimpo do Rock. Se este disco não fizesse parte da minha lista, a minha lista seria um brutal exercício de injustiça. 





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#9 - The Lexicon of Love - ABC


"Who broke my heart, you did, you did 
Bow to the target, blame Cupid, Cupid 
You think you're smart, stupid, stupid 
Shoot that poison arrow to my heart 
Shoot that poison arrow" 

Não sei o que o gentil e paciente leitor deste post poderá achar sobre o meu estranho critério, mas eu acredito mesmo que este refrão vale bem pela juvenil, folclórica e espalhafatosa década de 80. Se os ABC fossem apenas um bocadinho quântico mais melosos, explodiam. Mas por incrível que agora possa parecer, isto era na altura considerado cool à brava. The Lexicon of Love é uma opereta neo-romântica como deve ser, que declina as rendas nas mangas e as perucas de Versalhes para investir mais na produção orquestral e na intensidade lírica. A sofisticação melódica dos 10 temas deste disco será talvez apenas igualada, dentro do género, por uns rapazes de que falarei mais adiante, mas está muito próxima do máximo possível neste momento da história da música pop. Além disso, este magnífico disquinho funciona como um manual de normas para as misérias e os triunfos do amor passional - sem sacrifício do pudor ou da elegância. Os ABC são uma banda extremamente bem educada, e como a ética é uma estética, esta é uma obra realmente bela. E bela sobre o passar dos anos, virtude acessível apenas a uns quantos, afinal poucos, favoritos dos deuses.




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#10 - Back In Black - AC/DC


“Rock And Roll Ain’t Noise Pollution”
-Malcolm Young-

Julho de 1980. Cinco breves meses depois da morte por overdose do seu icónico e selvagem vocalista, Bon Scott, com quem tinham gravado a generosa quantidade de 6 discos, os AC/DC regressam de luto, com aquela que é, na minha mendiga opinião, a sua obra primeira e um monumento megalítico na história do Rock: “Back in Black” é um prodígio de virtuosismo e de energia, raro e electrizante fogo de Santo Anselmo e testemunho da afirmação, logo nos primeiros minutos do disco, de um outro icónico e selvático vocalista, Brian Johnson.
A estridência fabulosa destes dez temas, que vão ecoar sobre a eternidade como batalhas alexandrinas, é difícil de colocar em palavras sem sucumbir à tentação do exagero (porque este disco é um exagero de muitas coisas boas); e de qualquer forma toda a gente sabe do que estou a falar e eu estou a falar de uma banda divina. Por isso, querido amigo, gentil amiga, não te esqueças de revisitar “Back in Black”, de vez em quando. Vale uma aposta que a disposição sobe logo de tom?