O Itunes diz-me que ouvi este disco 43 vezes. Se calhar nem seria preciso dizer mais nada, mas a contenção verbal não é o meu forte e os The Killers merecem palavras.
Quando em 2004 a banda de Brandon Flowers lançou "Hot Fuss", desconfio que, da editora aos músicos, do público à crítica, toda a gente ficou com a clara convicção que tinha nascido um gigante. Os The Killers são, talvez acompanhados pelos Black Keys, uma das últimas grandes bandas de rock da história da música.
Arriscando um precário equilíbrio entre o registo croonie e a grandiloquência do palco sonoro que sabem montar como quase ninguém mais, lançando a ambição para patamares homéricos que são, no mínimo, perigosos e, no máximo, suicidários, a banda de Las Vegas (não podia ser de outro lugar) não tem medo do casino de probabilidades funestas em que se enfiou desde o princípio. Pelo contrário: apostaram tudo no número impossível e saíram a ganhar. Dos 6 discos que ponderadamente editaram em 16 anos de poker, não há uma obra menor, que defraude as expectativas da audiência ou a filosofia operática que assumiram desde sempre e para sempre.
Ainda assim, tenho que escolher "Day & Age", de 2008, o terceiro pontapé na lógica, não porque seja a aposta mais certeira, mas porque foi a que mais impactou o periclitante saldo da minha existência. Integrando duas cantigas declaradamente viradas para o jackpot comercial, "Human" e "The World We Live In", o disco vale muito para além dos dólares, e inclui também dois ou três black jacks como o febril foguetão melódico que é "Spaceman" ou a icónica e característica serenata "A Dustland Fairytale".
Sobre este último tema, que é de substância lírica e fôlego conceptual verdadeiramente impressionantes, acho que posso afirmar sem grandes reticências que reúne tudo aquilo que faz dos Killers uma banda de referência. Uma banda poderosa. Um fruto suculento entre serpentes insidiosas e pecados capitais.