domingo, junho 06, 2021

Haikus da Praia de S. João


Maio.
Se não fosse o vinho branco
estava a rapar um briol do pior.


Ventania.
O haiku sofre quando as páginas do caderno
não param quietas.


Passa o rabo de uma rapariga.
Os bikinis de hoje
matam-me o libido.


A boia publicitária, vermelha, enorme,
estraga a paisagem como as lombas pedonais
estragam a estrada.


Passa um bicho-helicóptero a toda a velocidade.
Que pressa pode ter
um insecto?


Na praia só há pescadores e surfistas.
E já é muita gente.


O oceano está zangado.
Mas os croquetes de alheira com molho de mel e mostarda
parecem bastante pacíficos.


O Instituto Português do Mar e da Atmosfera anunciava
um dia de sol.
Não percebem nada disto.


Comi e bebi como um lorde.
Pedir um dia quente seria até
excessivo.


Os cactos são mais friorentos
do que eu.


Aqui na esplanada entre as dunas, o tempo rende.
Ou então é a minha cabeça
que está a fazer horas extraordinárias.


Devia ter trazido o sobretudo.
Assim sendo, peço o Famous Grouse
sem gelo.


A minha pele precisa de sol
como esta página precisa de versos.


E pensar que há pessoas que rejeitam
a virtude do tabaco.


Quando o isqueiro já não consegue combater
a entropia do vento,
peço a conta.