Não tenho a certeza que governo nenhum seja pior que o governo de Costa, mas, ainda assim, pergunto-me: o que esperam ganhar o PCP e o Bloco de Esquerda com o chumbo do orçamento? E considerando a república deficitária, a economia insipiente, fragilizada pela pandemia e estruturalmente dependente da União Europeia, não seria preferível, tanto estratégica como patrioticamente, deixar esta queda para o fim de 2022 ou 23, quando o governo estaria ainda mais fragilizado e apodrecido?
É que as eleições legislativas que vão decorrer, tudo indica, em fevereiro (é impressionante como Portugal continua a viver numa espécie de slow motion em que são necessários quatro meses para realizar uma acto eleitoral que será a todos os títulos urgente), não vão premiar, por certo, as forças políticas que agora deixaram cair o governo socialista. Pelo contrário. Costa vai vitimizar-se (partindo do princípio, discutível, de que os barões e as bases do partido continuarão a sustentar a sua liderança) e ganhar através dessa vitimização os votos que vai perder pelo desgaste dos últimos anos, acabando muito provavelmente com um resultado parecido com o anterior. O PCP, que a cada eleição perde votos, porque os comunistas morrem a um ritmo superior àqueles que nascem, vai ter que sobreviver à responsabilidade do caos que criou. O Bloco, cuja missão de destruição dos valores civilizacionais parece já ter sido topada pelos portugueses, não tem absolutamente nada a ganhar com eleições antecipadas. Arrisca-se até a ser atirado para uma posição marginal no parlamento, tipo CDS mas de pernas para o ar.
À direita, Rio ou Rangel, que são gémeos ideológicos e que têm uma visão do PSD que é centrista e insubstancial e apelativa como uma embalagem de ovos podres, não terão certamente capacidade para fazer subir a deprimente fasquia eleitoral dos últimos registos do partido. E do CDS nem vale a pena falar. Mesmo que a desertificada agremiação entenda por bem aplicar o mais que merecido pontapé no rabo do imbecil que preside actualmente aos seus destinos; mesmo que Nuno Melo tenha vontade e condições para interpretar uma liderança forte, ideologicamente esclarecida e minimamente articulada, tenho as minhas dúvidas que consiga sacar do eleitorado um acréscimo superior a um ou dois por cento dos votos que miseravelmente somou nas últimas legislativas.
Se existem agrupamentos parlamentares com boas perspectivas para o acto eleitoral de fevereiro, esses agrupamentos serão o Chega e, talvez, o PAN. Mas um possível aumento de deputados para a desorganização partidária de André Ventura não se traduz em coisa nenhuma, porque o André Ventura é um verdadeiro pária da República. E o Pan está demasiado agarrado aos seus maniqueísmos para alguma vez ser levado a sério.
Perante este cenário, as próximas eleições legislativas podem resultar num regime ingovernável à esquerda, ingovernável de todo, ou viável apenas através de um frágil, pernicioso, corrupto e para-ideológico bloco central. E o que é que os portugueses ganham com isso? A irrelevância do Bloco, sim. A ausência, nos orçamentos de estado, da destruidora e deficitária influência da extrema-esquerda, sim. Mas pouco mais. Muito pouco mais.
Até porque, nos tempos que correm, entre o PCP, que mantém ao menos alguma integridade institucional, e a existência estéril, não reformista e aparatchick do PSD; entre o arrivismo woke do Bloco e a iníqua boçalidade do CDS do Xiquinho, venha o Marcelo e escolha. Em qualquer caso, para o futuro dos portugueses, as perspectivas não podiam ser mais deprimentes.