segunda-feira, março 14, 2022

O sábio e o czar: breve introdução à filosofia de Alexander Dugin.


Alexander Dugin, o filósofo tradicionalista que fundamenta a razão de estado de Putin, é a chave para perceber muito do que se está a passar no mundo, neste exacto momento.

Entendendo o liberalismo contemporâneo do Ocidente como um exercício de poder pan-fascista, rejeitando o carácter universal das premissas do iluminismo, do modernismo e do pós-modernismo, condenando na mesma medida o comunismo e o capitalismo, tentando uma abordagem nacionalista de base não ideológica, focada nas especificidades culturais, nos mitos fundadores e nos destinos históricos dos povos, Dugin constrói um arco poderoso de onde sai a seta que fere, com profundidade, o logos globalista do eixo Washington-Geneva.

Defendendo o direito do povo russo ao seu excepcionalismo euro-asiático, o professor da Universidade Pública de Moscovo abre caminho teórico para a praxis do Kremlin, focada na recuperação do poder, estatuto e influência de uma potência milenar.

Quem não é versado no jargão da filosofia precisa sempre de ter muito cuidado com o que Dugin diz, porque as palavras dele não querem dizer exactamente o que compreendemos nelas por convenção contemporânea, e têm que ser lidas de forma mediata. Vocábulos como razão, vontade, nação, liberalismo, conservadorismo ou diversidade são utilizados sempre dentro do contexto académico e qualquer tentativa de modernização do discurso do autor de "A Quarta Teoria Política" está condenada ao equívoco.

Alexander Dugin é um conservador. Mas não como um republicano do Texas. É um colectivista, mas não como um mineiro de Birmingham. Faz a crítica da razão iluminista, mas não como um zelota de Roma. Advoga a diversidade cultural e étnica, mas não como um burocrata de Bruxelas. É preciso regressar atrás, a uma certa filologia pré-moderna, para entender o homem.

Talvez por isso, e porque os testemunhos directos do filósofo moscovita disponíveis na net não são, dado o contexto censório actual, de grande qualidade, prefiro deixar aqui o articulado de Michael Millerman, um discípulo canadiano que traça por alto o pensamento do mestre, mesmo que a custo de alguma, excessiva, simplificação.

Mas também porque Steve Paikin, o âncora do programa televisivo canadiano de onde sai este clip, ilustra lindamente, através da sua ignorância desmedida e da sua chocante arrogância, típicas do liberal norte americano, a urgente necessidade de uma reacção dialéctica, que o pensador de Moscovo interpreta com profundidade que não tem grandes paralelos no panorama filosófico contemporâneo.