quarta-feira, junho 15, 2022

Novos e Nocturnos Haikus do Alto da Falésia (cont.)


Lua cheia.
Às vezes o Sol
É mais humilde.



Estou à espera que a Lua
Cresça no poente.
Entretanto, rebenta a tempestade.



Trovões.
Só no Inverno
É que passam a deuses.



Choveu a bom chover
Durante dois minutos.
Canícula de Junho.



Está demasiado calor
Para fazer mau tempo.



Plágio:
Quanto mais estrangeiros conheci,
Mais amei a minha pátria.*



À noite, todos os gatos são pardos.
Menos o Cenoura.




Considerando os protagonistas de Suetónio
Que morreram assassinados,
Não é recomendável a profissão de César.



Os Doze Césares são lição eloquente sobre a tragédia do poder.
Vinte séculos depois, Suetónio ainda não encontrou
um aluno bom.




Um César como deve ser mata filhos, pais e irmãos;
Fode como se não houvesse amanhã
E come como se sempre tivesse passado fome.



Césares à parte,
O que é que mudou?




A glutonaria passou a virtude
Quando a República passou a Império.




A baía recebe a chuva
Com religiosa gratidão.





Se voltasse ao princípio
Chegaria da mesma maneira
a este fim.





O mundo está de tal forma virado do avesso
Que aos artefactos de Satanás
Chamam os sábios, inteligência.





Estou cada vez mais alienado.
Às vezes uma notícia é razão suficiente
Para desejar a morte.





Escrevo haikus
com sílabas a mais:
Desespero.





Um gajo enervado
Não deve escrever
Haikus.





Quando escrevo haikus
directamente no computador
O Moleskine fica zangado.





Podem odiar-me à vontade.
Desde que seja
Pelas razões certas.



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* "Plus je vis d’étrangers, plus j’aimai ma patrie"
Dormont De Belloy