Se alguém me dissesse há três anos atrás, nem é preciso regressar muito no tempo, que em Fevereiro de 2024 estava a gravar entrevistas com políticos, eu responderia com uma alarvidade qualquer, do género: "Já bebeste um copo a mais."
Muito sinceramente, nunca imaginei que tal coisa fosse sequer possível. Nunca imaginei que me predispusesse a essa tarefa, na minha sobranceria de rebelde irrredutível e de personagem de bastidores.
A vida leva-nos por percursos surpreendentes e o ContraCultura, que nos últimos meses tem de facto ganho novas energias em várias dimensões, está a conduzir-me por caminhos que consideraria improváveis à partida.
Ainda na quinta-feira estava a gravar o episódio piloto de uma parceria com o Canal do Sérgio Tavares, que deve ir para o ar no princípio de Março e a pensar para mim mesmo: como é que vieste aqui parar, pá?
A perplexidade é grande, até porque este rumo rompe com um princípio profissional que sempre tentei seguir na vida e que é muito simples: limita-te a fazer aquilo que sabes fazer bem. E eu não sei fazer bem entrevistas a políticos, nem sou propriamente um tipo treinado na oralidade do podcast, nem tenho preparação técnica ou até o equipamento necessário para que os produtos saiam com um desenho profissional.
Ainda assim, estas experiências, que já percebi que vão acontecer com mais e mais frequência, têm sido, também surpreendentemente, positivas. Ou mais que positivas: gratificantes. Hoje tive uma conversa com o Nuno Afonso, o fundador do Chega que agora lidera o Alternativa 21, que vai resultar num pobre produto técnico por várias razões relacionadas com a captação de som no entrevistado e com a plataforma digital onde optei - e mal - por realizar a entrevista, mas que foi, muito sinceramente, de uma consolação enorme. Do outro lado estava uma pessoa genuína, inteligente, educada, voluntariosa e humilde, no melhor sentido da palavra, que trai completamente a imagem que tenho na cabeça do que é um político.
A conversa fluiu como se nos conhecessemos de gingeira e o Nuno foi sempre assertivo sem deixar de parecer uma pessoa sensível e moderada e tolerante, mesmo quando falou de assuntos polarizadores à brava, como a presença de homens biológicos nos desportos femininos, por exemplo.
Todas as conversas desta série encaixaram aliás num registo informal, simpático e sincero, que vai completamente contra o registo deste tipo de situações na "grande política". O Nuno Matos Pereira, do ADN e o João Pais do Amaral, da coligação Ergue-te, foram entrevistados super simpáticos, honestos, transparentes de agenda e completamente despidos de pretensão. E isso foi, para mim, quase tocante. No que tem a ver com o conteúdo das conversas, dificilmente poderia desejar que corressem melhor, na verdade.
Não deixo porém de me perguntar até que ponto é que estou a ser levado ao Princípio de Peter. E muitas vezes, nos últimos tempos, tenho pensado para com os meus botões se sou eu que mando no Contra ou é o Contra que manda em mim.
A ver vamos.