Dizem os sábios d'agora que a luz
- A luz do sol que nos convida para o dia,
Que nos aquece concretamente o rosto encarquilhado -
É uma onda e uma partícula ao mesmo tempo
E ao mesmo tempo o fotão, ubíqua obra da imaginação laboratorialista,
Pode estar aqui e ali.
Digo eu: balelas!
Balelas porque a luz que me aquece o rosto
Está aqui e eu sinto-a nas rugas,
Não está, a mesma luz, nas rugas da Maria da Fonte.
E digo eu: Balelas!
Porque saber se a luz é onda ou partícula
Não é tarefa de gente; não faz ninguém feliz
Nem leva a criança embirrenta para a cama
Quando já são horas de terem os pais algum sossego;
Nem é por ser ou não ser ondulatória a energia,
Nem é por ser ou não ser imprevisível a matéria,
Que o castanheiro vai deixar de me oferecer a frescura da sesta,
Ou que os sinos da minha aldeia deixam de cantar o meio dia,
Por muito que me doam as badaladas nas orelhas da alma.
(Se preguiçasse o sacristão, seria eu mais grato a Heisenberg?).
E digo eu: Balelas!
O milho que cresce serenamente nos campos doirados,
Será um dia colhido e dele fará o Tio Joaquim da Felismina
Uma belíssima broa
E não há Princípio da Incerteza que nos valha:
A broa existe e é belíssima e é tudo.
Não sou crente nos conceitos, bastam-me as cousas naturais,
As cousas que observo e cheiro e sinto na pele dos sentidos
São já sublimes e metafísicas o bastante;
Para apreciar o vinho doce da D. Alice da Venda
Não preciso de saber nada sobre a fluidez espontânea do Bosão
E para que me dê prazer imenso a leitura do Cesário,
Não me faz falta nenhuma o conhecimento da exacta posição
Desse enigmático protão que circula na magia negra da órbita atómica
Num dado e misterioso momento cósmogónico.
A ciência é uma religião e a religião cansa-me excessivamente.