sábado, janeiro 04, 2014

O blog que não se vai embora.


Antes da invenção do blog, tinha uma gaveta. Essa gaveta era tristonha, como são todas as gavetas onde guardamos os escritos. A invenção do blog acendeu a luz sobre esses escritos e os outros, que estavam por escrever porque não queriam depois ser fechados na escuridão tristonha da gaveta. Tive vários blogs que não duraram lá muito tempo porque nasceram da pressa que eu tinha de desengavetar rapidamente os escritos que estavam na gaveta e os outros que não queriam sair, e essa pressa era de alguma selvajaria. Essa pressa era altamente volátil. O blogville porém, teima na sua longevidade. Tendo sido construído com constância, embora nem sempre com consistência, durante a última década, é um objecto que encontra a sua razão de ser no simples facto de existir sobre o tempo, num momento da história em que a longevidade não é uma virtude. Eu não desisto dele e ele compensa-me com liberdade. Com liberdade para me expressar aos gritos e aos pontapés, com liberdade para me irritar, com liberdade para insultar e para elogiar, com liberdade para discordar e discutir e pedir desculpa. Com liberdade para não ter problema nenhum em escrever exactamente aquilo que penso num momento da história em que essa liberdade sai cada vez mais cara. Este blog é uma espécie de mecanismo anti-facebook. Nunca pretendeu ter audiência para além dos amigos e familiares mais próximos. Nunca quis ser - e nunca seria mesmo que o quisesse - uma página simpática. E é precisamente por não ter uma dimensão pública, por não ter vocação mediática, por ser antipático e por circular quase exclusivamente por quem faz parte do meu primeiro círculo social, que é livre e que é honesto. Quando escrevo aqui, as pessoas que me lêem reconhecem a minha voz. Podem recusar os meus argumentos, evitar os meus versos, questionar o meu gosto e o meu senso, mas sabem que isto sou eu. Que este é o meu blog e que o meu blog não podia ser de outra maneira. A essas pessoas, que me conhecem e que me aturam, que têm a gentileza de passar por aqui para saber o que é que eu estou a pensar, mesmo quando o que eu estou a pensar lhes parece absolutamente desaustinado, dedico estes dez anos de posts.