Elon Musk é um comediante. E isso está muito bem. O problema é quando as pessoas levam os comediantes a sério. E isso é que já não está nada bem.
Sou um incondicional da exploração espacial e desejo ardentemente o relançamento da aventura cósmica como eixo fundamental para a realização da humanidade. Não acho, sinceramente, que Marte seja o destino mais interessante. Há locais no sistema solar bem mais apelativos para a ciência como Enceladus, a sexta lua de Saturno, ou Europa, outra insignificante lua de Jupiter, que encerram, debaixo de finas camadas de gelo, oceanos de água tépida.
Mas por mim, tudo bem. Se é Marte o objectivo, que se cumpra o objectivo. Na minha maneira de ver as coisas, vale sempre a pena deixar a atmosfera da terra nem que seja para visitar uma rocha estéril à deriva no espaço. Nesta matéria, o que conta mais é a glória da aventura.
O projecto de Musk, porém, mexe-me imenso com os nervos da irritação. E mexe assim comigo, é assim irritante, porque é muito feio mentir desta maneira. Iludir as pessoas desta maneira. Falsificar a realidade desta maneira.
A SpaceX nunca explicou como é que vai reduzir os custos da aventura
cinco milhões de vezes, como afirma que é necessário para que o projecto
seja viável. Nunca explicou como tenciona proteger os astronautas da
radiação com que vão ser atingidos durante as viagens. Nunca explicou
como é que vai criar energia e inventar as estruturas para proteger os
colonos das temperaturas extremas do planeta e para criar ambientes
pressurizados e ricos em oxigénio onde eles possam viver. Nunca explicou
como é que vai alimentar esta gente toda. Como é que vai ter água para
dar de beber a esta gente toda. Nunca explicou como é que esta gente
toda vai procriar ou sequer sobreviver num ambiente super hostil e com
pressões gravíticas radicalmente diferentes das que existem na Terra
(ninguém sabe ao certo como se desenrolará um parto num planeta que
exerce um terço da pressão gravítica da Terra). Nunca explicou como é
que vai conseguir lançar mais de mil missões em cerca de 60 anos. Nunca
explicou onde é que vai arranjar o diabo do dinheiro para tudo isto,
sendo que esta será, de longe, a mais cara iniciativa da história da
humanidade e sendo que nem sequer se percebe quais as riquezas que o
planeta oferece para justificar o investimento.
O único trunfo que a SpaceX tem na sua cómico-trágica manga é o facto de ter um foguetão que é capaz de sair da atmosfera e entrar outra vez na atmosfera para voltar a sair dela e regressar outra vez e assim sucessivamente até que entretanto alguma coisa corra mal. O foguetão reutilizável é uma boa ideia. Mas, gentil leitor, não resolve grande coisa se o teu sonho for passar um fim de semana nas montanhas rochosas do Planeta Vermelho. E não resolve mesmo nada se a tua ambição for a que Musk diz ser a dele: a colonização massiva de Marte no espaço de um século.
Na verdade, o projecto Marte de Elon Musk não tem qualquer
sustentabilidade técnica, contabilística ou científica. É uma mera manobra publicitária,
como a a maior parte das iniciativas empresariais do milionário
canadiano. É um belo PowerPoint. Mas é apenas isso.
A prova derradeira da fraude de que falo é esta mais que amadora, mais que hesitante, mais que incompleta, mais que vaga, mais que não científica apresentação do projecto, por parte de quem o dirige: Paul Wooster, o engenheiro que chefia o projecto.
Que tristeza, senhores.
Elon Musk não passa de um charlatão. Mas, como é um charlatão a que as pessoas parecem achar alguma piada (mais vale cair em graça do que ser engraçado), está de facto a enganar meio mundo. Ainda por cima, com a mais quimérica das promessas: a da conquista espacial.
Eu cá acho que não devemos brincar com sonhos assim. Mas isto sou eu que não tenho sentido de humor nenhum nem vejo qual é a piada que tem este comediante.
Fontes:
Business Insider
New York Post
Inc.com
The Guardian
The Conversation