quarta-feira, maio 27, 2020

A discoteca da minha vida: discos 16 a 20.

#16 - 1984 - Van Halen

É complicado eleger um disco entre a épica discografia dos Van Halen. Eu escolho este, o último com o estridente e saltitante David Lee Roth (que foi a seguir substituído por outro grande maluco, Sammy Hagar). Para além da embalagem, que é fabulosa, o vinil lá dentro bomba que nunca mais acaba e introduz, pela primeira vez na história da banda, a utilização de sintetizadores. O resultado não deixa de ser uma cena típica dos Van Halen - eléctrica, virtuosa e primordial - mas traz um sabor novo, mais sofisticado e onírico, que só eleva a fasquia de qualidade que a banda já trazia no seu recorde de belas e gritantes óperas rock.
Tenho a sensação de que se tivesse respeitado o desafio de enumerar 10 discos apenas, este 1984 estaria lá, nessa lista impossível para mim.





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#17 - Steeltown - Big Country

Bem vindos às terras altas. E agasalhem-se porque o que vos trago neste post é uma agreste e incisiva ventania escocesa. Se “Steeltown” fosse mais genuíno, rebentava. Se fosse mais verdadeiro, rebentava. Se fosse mais másculo, rebentava. Oscilando perigosamente entre o registo operário e a tradição rural do folk pátrio, de que fazem bandeira apocalíptica, os Big Country encontram aqui, há segunda tentativa, o seu equilíbrio estético e a sua vocação alternativa: este disco e esta banda são tão lado B da história que tive dificuldade em encontrar um clip decente para colocar na caixa de comentários. É que a bateria de poderosos lamentos sónicos, que podiam ter sido compostos por pastores renegados ou por mineiros em greve, está mais interessada na revolução do que na posteridade.
Mais a mais, os Big Country são a completa definição de uma banda de culto e nem que fosse só por causa disso, merecem esta entrada.





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A imagem pode conter: uma ou mais pessoas#18 - Purple Rain - Prince and the Revolution 

Tinha que ser, não é? Nunca simpatizei muito com ele, como estrelinha rock, para ser sincero, mas isso não quer dizer que o senhor Prince, ou lá como é que ele gostava de ser chamado, não mereça um lugar no inferno dos grandes artistas, porque merece completamente. “Purple Rain” é uma demonstração assombrosa de talento criativo e virtuosismo técnico que deixa qualquer um meio bêbado com meio vodka. O homem deve ter feito aqui um pacto com o diabo, ou assim. Canções eternas como “When Doves Cry” ou “I Would Die 4 You” ou “Purple Rain” não se produzem como máscaras cirúrgicas e não se encontram por isso com abundância estatística na história universal das pedras rolantes. É preciso ter muito poder e balanço e vontade de seguir um caminho próprio. É preciso não ter medo de correr riscos e fazer dos riscos, profissão de fé. E depois é preciso, claro, génio. Este disco, é de génio.
Next.





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#19 - Fugazi - Marillion


"Where are the prophets, where are the visionaries, where are the poets
To breach the dawn of the sentimental mercenary"
   
- Fish -

36 anos passados, fico todo fritado só de pensar que “Purple Rain”, o anterior disco desta lista sem fim, foi editado exactamente no mesmo ano que “Fugazi”, o vinil eleito de hoje. São objectos antagónicos. Diacrónicos. Némesis um do outro como anti-fotocópias.
Os anos oitenta não existem.
Este disco é, antes de ser música, poesia. Fish escrevia como um profeta ensandecido e o que realmente sempre me pasmou é como é que a banda conseguia fazer música sobre estes versos enormes e caóticos, grandiloquentes e pesadíssimas peças de mobiliário existencial; uma espécie de rap ao contrário.
Depois, claro, este disco é a sua progressão desenfreada e grandiosa. Nunca fui um doido por rock sinfónico, mas sou um doido pelo rock sinfónico dos Marillion, que é incapaz de dar seca seja a quem for. Os temas de “Fugazi” desenrolam-se no sentido do triunfo e o triunfo está lá, sempre. Num apogeu de sintetizadores analógicos e guitarras heroicas.
A coisa toda é uma epopeia romana, decadente e ensopada em ácidos, que eu, muito simplesmente, amo de morrer. E digam o que disserem.




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#20 - Mirror Moves - Psychedelic Furs


Por incrível que possa parecer nos dias de hoje, esta já foi a banda de rock alternativo mais amada que se possa imaginar. Em Benfica dos anos 80 toda a gente adorava isto. E por maioria de razão: os Psychedelic Furs não se confundiam com mais ninguém e a voz arrastada e melosa de Richard Butler caia perfeitamente nos riffs post-punk de Rich Good, num combinado que servia tão bem à depressão do adolescente com dor de corno, como à mais ganzada e bem disposta coquete da discoteca. Este disco, "Mirror Moves", será, talvez, o apogeu da banda precisamente por causa da sua abrangência melódica: ao rodeio eléctrico e alucinado de "Here Come Cowboys" somam-se aventuras de teor neo-romântico como "Heaven", trips melancólicas como "The Ghost In You" e correrias inesperadas no indisciplinado ginásio rítmico do brit pop como "Heartbeat". O talento chegava e sobrava para todo o género de aventuras e os Psychedelic Furs não se faziam rogados: disparavam malhas em todos os sentidos, sem perderem nunca o sentido do que lhes era fundamental - um impecável e inconfundível e rebelde primado estético. 
Que granda banda, bom Deus.