sexta-feira, julho 23, 2021

Fazer batota para acabar com a democracia. Breve manual de normas. Parte 3.

Caso de Estudo #07
Engenharia demográfica: abolir as fronteiras para aceder a mão de obra barata e alterar os equilíbrios políticos.


As democracias ocidentais foram edificadas para servirem os povos eficazmente no contexto de um dado território geográfico e cultural. A maior parte delas foram também circunscritas a realidades religiosas e étnicas, mas, por razões de economia do teu tempo e do meu, prezado leitor, vamos calibrar o foco essencialmente nos primeiros dois critérios (os outros virão por acréscimo).

O cálculo constitucional dos fundadores teria assim que integrar as seguintes premissas:
- Um perímetro com fronteiras fechadas, mesmo que aceitando de bom grado fluxos imigrantes, em função do território disponível e da capacidade da economia em criar novos postos de trabalho.
- Um corpo demográfico com valores culturais comuns, mesmo que relativamente receptivo a novos inputs, embora restritivo no que respeita à língua e aos objectivos últimos do projecto social em causa, que no caso das democracias ocidentais são a liberdade, a prosperidade e a dignidade como motores da felicidade humana.

Ora, o trend globalista que triunfou no Século XXI entende que as fronteiras são, para além de caducas, imorais. E para além de imorais, ineficientes.

Numa primeira fase, ainda no fim do Século XX, Os conglomerados económicos, cujo capital anónimo não conhece outro valor que o do lucro, aperceberam-se das vantagens da actividade a nível planetário, procurando a mão de obra não qualificada e, por isso, muito menos onerosa, fora da esfera ocidental.

Para além de empobrecer dramaticamente as classes médias e médias-baixa dos seus próprios países, a deslocação industrial não teve sequer o efeito de enriquecer as populações dos países não ocidentais. A única vantagem que trouxe esta globalização "de dentro para fora", foi a de enriquecer os accionistas das grandes multinacionais.

Mais recentemente, porém, assistimos à globalização "de fora para dentro". Na Europa, já sujeita às pressões do espaço Schengen, nem sempre tão pacíficas como a doutrina de Bruxelas quer fazer crer, a fragilidade da segurança social alemã, resultante de uma muito baixa taxa de natalidade entre os seus cidadãos nativos, em conjunto com outras variáveis como a ideologia semi-marxista das elites, o complexo de culpa que domina a psico-sociologia germânica desde o fim da Segunda-Guerra Mundial e a necessidade de mão de obra não qualificada num país com altos índices de formação, levaram a uma abertura à imigração massiva de povos de culturas muito diferentes, provindos do Médio-Oriente, do Magreb, da África Oriental e de uma multiplicidade de localidades antípodas como o Paquistão ou o Bangladeche.

Dado o contexto normativo da União, que implica a livre circulação de pessoas, esta política alemã impactou demograficamente toda a Europa, com especial incidência, naturalmente, nos países mais ricos, como a França, a Inglaterra e a Espanha, que já tinham os seus próprios fluxos imigrantes estabelecidos pela conexão com países que faziam parte do seu legado colonial, ou como a Suécia e a Dinamarca, que se viram confrontados com um fenómeno para o qual não tinham referência operacional.

Nos Estados Unidos, por pressão de Silicon Valley, primeiro, e depois por clara intenção do Partido Democrata em alterar o equilíbrio ideológico do eleitorado, o controlo de fronteiras foi sendo progressivamente relaxado, ao ponto máximo que testemunhamos hoje: a administração Biden já não faz diferença entre imigração legal ou ilegal, acolhendo sem critério as multidões vindas de todo o planeta, atraídas pela promessa de uma vida melhor à caótica fronteira com o México. A situação é de tal forma abstrusa, que o Pentágono está neste momento a transportar milhares de imigrantes ilegais por dia, da fronteira para o interior da federação.


Ora, este descontrolado abrir de portas à imigração a que assistimos quotidianamente na Europa e nos Estados Unidos, tem consequências profundas no tecido demográfico e social e cultural do Ocidente porque os povos que são integrados no esquema constitucional não são antropológica, psicológica, económica e politicamente aptos à prossecução das lógicas civilizacionais que os povos nativos dão como naturais.

Um exemplo claro, entre dezenas que podia enumerar é o da ascensão social. O capitalismo de base liberal implica um potencial de mobilidade sócio-económica, que é mais ou menos efectivo em cada localidade da geografia política do Ocidente, mas que faz parte do patamar de aspirações dos seus cidadãos. Os imigrantes hindus, na sua maior parte, nunca aceitarão esta premissa, na medida em que transportam para os países de destino uma estruturação social por castas, geneticamente determinada, que é a referência na Índia.

Paralelamente, as tradições helénicas e judaico-cristãs que deram origem à ciência política do Ocidente esbatem-se e diluem-se na multiplicidade de outras tradições religiosas e filosóficas dos povos imigrantes, que são frequentemente incompatíveis ou até avessas ao modelo implementado deste lado do mundo.

Daí os diferentes graus de aplicabilidade do quadro jurídico e constitucional das repúblicas e das monarquias europeias, em função de etnias e credos. Daí as "No Go Zones", guetos onde a lei não incide e aos quais as forças de segurança dos estados não acedem. Daí a discriminação e objectificação das mulheres em países que se orgulham do seu histórico percurso de emancipação feminina. Daí o decaimento dos níveis de alfabetização em sociedades que obrigam a um longo período de escolaridade. Daí as bolsas de miséria um pouco por todo o lado e o aumento dramático dos índices de criminalidade em nações que até há muito pouco tempo eram dos territórios mais seguros do mundo, de que é claro exemplo a Suécia. Daí o novo normal dos números de desemprego absolutamente anormais. Daí os custos galopantes da assistência social e dos serviços universais de saúde que levam à falência técnica das contas públicas e ao perpétuo e incomensurável endividamento dos Estados. Daí as tensões sociais, dramáticas, que se vivem hoje em França e que ameaçam a guerra civil. Daí a eleição de autarcas como Sadiq Khan, o Mayor de Londres, que é declaradamente um inimigo dos valores ocidentais. Daí a alteração de cor ideológica em estados da federação americana que eram tradicionalmente republicanos, rompendo lógicas centenárias de alternância de poder, estabilidade dos sistemas sócio-políticos e coerência dos órgãos judiciais. Daí a queda das identidades nacionais num inferno tribal. Daí o trambolhão moral dos indivíduos num relativismo sem referências de virtude, dever, honra e dignidade.

Daí a fragilidade económica, cultural e operacional do Ocidente.

Daí o viciar do jogo democrático, em que a vontade das maiorias não prevalece sobre certas minorias, em que o velho equilíbrio das forças políticas em presença é adulterado pela entrada no mercado eleitoral de populações que não entendem nem se revêm nos valores e nas premissas que fundamentam o sistema e que são facilmente manipuladas pela ideologia que lhes abriu as fronteiras.

E se achas que isto não é fazer batota, paciente leitor, não contes comigo para um jogo de cartas.


(Cont.)
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