terça-feira, agosto 30, 2011
segunda-feira, agosto 29, 2011
Há um buraco no céu.
Há um buraco no tempo e eu entro.
Há um paradoxo pela memória adentro,
Um negativo inverso que se faz tarde e eu vou.
Há um epicírculo, um centro, um vórtice que se fechou,
Por onde o vácuo se esgota e a morte se dissemina.
Há um buraco escancarado na consciência assassina,
Um autismo elíptico, sinusoidal, genomático,
Um síndroma celular de gatilho automático,
Uma singularidade voraz, uma convocatória,
Uma doença de cadáveres na peste fotográfica da história.
Olho lá para o fundo e afundo-me:
É ao diabo que dedico esta dedicatória.
Regresso ao inferno com febre de me perder,
Dou-me para ser esquecido e esqueço-me de me esquecer.
Há um buraco no céu com rugas de sangue e eu entro e eu sou
Esse apocalipse que me chama para onde estou,
De volta e sem retorno, de vez e eu vou.
Há um buraco no céu e eu entro,
Há um paradoxo pela memória adentro.
Há um vórtice que me devora e a vertigem cresceu.
Há um buraco anti-matéria na súplica de Orpheu,
Um fantasma anónimo que desapareceu.
Há uma fonte que secou e não sei de que nascente nasceu.
Há uma súbita ausência de tudo o que aconteceu.
Há um um iato, um silêncio, um vazio redondo no estrondo que se deu,
Há um poço sem fundo no fim do mundo,
Há um buraco sem véu nas velas do céu,
Há um vento que beija o deserto que ardeu,
Há tanto para ganhar como o que se perdeu
E eu já não sei se a vida que existe é a vingança de Prometeu
Ou uma cratera lunar no azul que amanheceu.
Há um buraco no céu e a alegria morreu
E a alegria morreu.
sábado, agosto 20, 2011
Rocketville #0_Código Postal ou o elogio do foguetão.
Sonho com o dia em que deuses astronautas me elevem da terra,
À boleia de um opiário sideral.
Não me importa o destino nem o improvável regresso ao planetário natal.
Não quero saber das saudades:
Nas profundezas do espaço hei-de encontrar Portugal.
Anseio por que me raptem lagartos indígenas de galáxias obscuras,
Mestres e divindades e imperadores das alturas,
Almirantes rendidos às forças do mal,
Astronautas que me elevem da terra, numa boleia sideral.
Sacrifico-me às piores torturas, à agonia das imponderabilidades
E ao esquecimento final;
Quero é partir foguetão, com tonturas e fatalidades de inércia astral!
E não me venham com as saudades:
Há um cosmos de localidades
E eu, com mil diabos, hei-de encontrar Portugal.
quarta-feira, agosto 17, 2011
domingo, agosto 07, 2011
No Reino de Artur
FICÇÃO CRIADA A PARTIR DOS HABITANTES DAS ESTÓRIAS DE ARTUR PAIXÃO
Floriano do Ó roda nos dedos a pastilha para a azia
Que traz na alma,
Enquanto o Homem das Massas
Disserta sobre conteúdos e audiências e emborca um escocês de 12 anos
Como se no guião do destino não houvesse amanhã.
Não fosse já bastante o martírio, entra p'lo escritório,
De litrada em punho no desabrigo da sua filosofia,
Malaquias da Saudade, cambaleando numa gritada infernal
Sobre a falência de Deus.
Atrás dele, como um paparazzi na perseguição do escândalo,
Vem o Rúben Perdigoto;
E atrás dele, como um inquisidor na urgência da fogueira,
Vem o padre Tristão.
Está instalado o bordel.
Floriano do Ó aguenta-se, cada vez mais pequenino
Na sua cadeira de tédio.
Para enganar o ruído trauteia para dentro,
Num inglês inventado, acordes sinceros:
Ai gotchiú ander mai sequine.
Não há Francisco Alberto, como o Francisco Alberto Sinatra.
O escritório tem cinco lugares sentados, apenasmente
E já se dá pelo incómodo da polifonia abundante por metro quadrado
Quando chega Segismundo d'Ávila, artista plástico.
Traz o fumo do seu cigarro francês e a pretensão indefinida
De quem fuma tabaco estrangeiro.
Traz sarilhos e promete um pontapé bem acertado
No complexo genital de Rúben Perdigoto,
"Que é por causa das tosses, e da Hortense Luz,
Essa viúva impoluta que ousaste corromper,
Seminarista do diabo!"
Ao apelo das primeiras porradas, responde Anacleto Gadelhas,
Gorila de serviço e pistoleiro do pôr do sol,
Rompendo pela sala como o Jonh Calmeirão no seu cavalo branco,
Mas na verdade apeado de todo, até de bom senso e, acto contínuo,
Sai um pontapé na boca do Padre Tristão
E mais um estaladão na bochecha vermelhusca de Malaquias e
Fica a questão da metafísica mais que resolvida.
Floriano do Ó resiste, cada vez mais diminuto
No seu banquinho de sonhos.
Pesam-lhe os olhos interruptores
Enquanto entre o céu e o inferno
Se plasma a corrente alternada:
Agora nos braços da Gervásia, agora na tasca do Azambrino.
Uma coisa é certa no universo e essa coisa
É o caos e o caos tem uma gravidade própria e por isso
Atrai mais confusão ainda, numa espiral esfomeada de factores exponenciais.
Agora é a Anástácia dos Cogumelos,
A fiel e farta secretária do Homem das Massas
(E que lhe dá secretaria de todas as maneiras
Que se podem imaginar)
Que cai histericamente em cena, anunciando o apocalipse:
"Patrãozinho, patrãozinho, é melhor raspar-se que o meu Farturas
Vem aí para o matar!"
Nem tempo para o pânico, nem instante
Para a presença de espírito,
Eis o Farturas enraivecido que surge disparado
Pela janela panorâmica
(Com vista para o centro histórico de Mem Martins
E a ria da Bobadela).
É a cegada total.
Floriano do Ó sobrevive, cada vez mais ínfimo
No seu periclitante tripé de fantasias.
Vai-se encolhendo para dentro da orquestra
Do sono, numa beatitude de falsete:
Ai gotchiú dipe ine da arte ove mi.
Não há Francisco Alberto, como o Francisco Alberto Sinatra.
Ainda assim, ia correndo a vida muito bem,
Entre facadas e desmaios, com sangue na alcatifa
E vinho tinto nos cortinados,
Com dentadas de última ceia e promessas
De "como-te vivo!",
Se não marcasse inesperada, infeliz e truculenta presença
O bom do Serafino Condesso
E toda a respectiva tropa testamentária, a saber:
Leopoldina - sua consorte,
Fagundes - seu primo,
Felismina da Vacaria - seu consolo,
Ti Timóteo - seu taberneiro e
Gamito da Pá - seu coveiro.
Claro está, é tudo apanhado no fogo cruzado
Dos cornos postos a nú e tirados a limpo e, claro está:
É o faroeste completo.
Floriano do Ó adormece, quântica silhueta
No abismo do seu trapézio de acrobata
Sinistrado. Mandem vir os palhaços!
E entre o circo, o sono e o sonho,
A corrente alternada continua a bombar:
Agora nos braços da Gervásia, agora na tasca do Azambrino.
E entre o circo, o sono e o sonho,
Há uma voz que vem do fundo do poço da vida:
Sou dipine mai arte déte iúar aparte ove mi.
Floriano do Ó roda nos dedos a pastilha para a azia
Que traz na alma,
Enquanto o Homem das Massas
Disserta sobre conteúdos e audiências e emborca um escocês de 12 anos
Como se no guião do destino não houvesse amanhã.
Não fosse já bastante o martírio, entra p'lo escritório,
De litrada em punho no desabrigo da sua filosofia,
Malaquias da Saudade, cambaleando numa gritada infernal
Sobre a falência de Deus.
Atrás dele, como um paparazzi na perseguição do escândalo,
Vem o Rúben Perdigoto;
E atrás dele, como um inquisidor na urgência da fogueira,
Vem o padre Tristão.
Está instalado o bordel.
Floriano do Ó aguenta-se, cada vez mais pequenino
Na sua cadeira de tédio.
Para enganar o ruído trauteia para dentro,
Num inglês inventado, acordes sinceros:
Ai gotchiú ander mai sequine.
Não há Francisco Alberto, como o Francisco Alberto Sinatra.
O escritório tem cinco lugares sentados, apenasmente
E já se dá pelo incómodo da polifonia abundante por metro quadrado
Quando chega Segismundo d'Ávila, artista plástico.
Traz o fumo do seu cigarro francês e a pretensão indefinida
De quem fuma tabaco estrangeiro.
Traz sarilhos e promete um pontapé bem acertado
No complexo genital de Rúben Perdigoto,
"Que é por causa das tosses, e da Hortense Luz,
Essa viúva impoluta que ousaste corromper,
Seminarista do diabo!"
Ao apelo das primeiras porradas, responde Anacleto Gadelhas,
Gorila de serviço e pistoleiro do pôr do sol,
Rompendo pela sala como o Jonh Calmeirão no seu cavalo branco,
Mas na verdade apeado de todo, até de bom senso e, acto contínuo,
Sai um pontapé na boca do Padre Tristão
E mais um estaladão na bochecha vermelhusca de Malaquias e
Fica a questão da metafísica mais que resolvida.
Floriano do Ó resiste, cada vez mais diminuto
No seu banquinho de sonhos.
Pesam-lhe os olhos interruptores
Enquanto entre o céu e o inferno
Se plasma a corrente alternada:
Agora nos braços da Gervásia, agora na tasca do Azambrino.
Uma coisa é certa no universo e essa coisa
É o caos e o caos tem uma gravidade própria e por isso
Atrai mais confusão ainda, numa espiral esfomeada de factores exponenciais.
Agora é a Anástácia dos Cogumelos,
A fiel e farta secretária do Homem das Massas
(E que lhe dá secretaria de todas as maneiras
Que se podem imaginar)
Que cai histericamente em cena, anunciando o apocalipse:
"Patrãozinho, patrãozinho, é melhor raspar-se que o meu Farturas
Vem aí para o matar!"
Nem tempo para o pânico, nem instante
Para a presença de espírito,
Eis o Farturas enraivecido que surge disparado
Pela janela panorâmica
(Com vista para o centro histórico de Mem Martins
E a ria da Bobadela).
É a cegada total.
Floriano do Ó sobrevive, cada vez mais ínfimo
No seu periclitante tripé de fantasias.
Vai-se encolhendo para dentro da orquestra
Do sono, numa beatitude de falsete:
Ai gotchiú dipe ine da arte ove mi.
Não há Francisco Alberto, como o Francisco Alberto Sinatra.
Ainda assim, ia correndo a vida muito bem,
Entre facadas e desmaios, com sangue na alcatifa
E vinho tinto nos cortinados,
Com dentadas de última ceia e promessas
De "como-te vivo!",
Se não marcasse inesperada, infeliz e truculenta presença
O bom do Serafino Condesso
E toda a respectiva tropa testamentária, a saber:
Leopoldina - sua consorte,
Fagundes - seu primo,
Felismina da Vacaria - seu consolo,
Ti Timóteo - seu taberneiro e
Gamito da Pá - seu coveiro.
Claro está, é tudo apanhado no fogo cruzado
Dos cornos postos a nú e tirados a limpo e, claro está:
É o faroeste completo.
Floriano do Ó adormece, quântica silhueta
No abismo do seu trapézio de acrobata
Sinistrado. Mandem vir os palhaços!
E entre o circo, o sono e o sonho,
A corrente alternada continua a bombar:
Agora nos braços da Gervásia, agora na tasca do Azambrino.
E entre o circo, o sono e o sonho,
Há uma voz que vem do fundo do poço da vida:
Sou dipine mai arte déte iúar aparte ove mi.
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