Por Nuno Miguel Silva
Texto publicado a 24/02/17 no Jornal Económico
O último livro do escritor norte-americano Dennis Lehane publicado em Portugal surgiu nas livrarias nacionais no verão do ano passado, com o título ‘Moonlight Mile – A Última Causa’, mas data de 2010. O escritor que traçou inesquecíveis retratos da sua cidade-fétiche, e de centenas de personagens com que a povoou nas diversas obras, regressa ao thriller psicológico, terreno em que é um dos melhores escribas da atualidade. E retorna ao par de detetives que criou ao longo da sua profícua carreira literária: Patrick Kenzie e Angie Gennaro.
Boston volta a ser protagonista num tortuoso regresso ao passado, outra imagem de marca do autor. Uma mulher pediu para lhe encontrarem a sobrinha de quatro anos, que havia desaparecido. Os detetives conseguiram esse intento. A menina foi devolvida, mas a uma mãe negligente e alcoólica. Agora, 12 anos depois, Amanda volta a sair do radar e os detetives de Lehane voltam a entrar em cena.
Há um minucioso destrinçar dos laços familiares e sociais enquanto a cidade de Boston fervilha em pano de fundo. Lehane tem estilo, muito e bom; tem ritmo. É preciso, conciso, destila poesia, enaltece a amizade e o amor, desmascara a violência e alguns bastidores de poder. Há uma queda pelo gótico, pela ficção ‘pulp’, pelos filmes de série B, pelas noites negras. Há tensão e vingança, um bisturi manobrado com precisão.Tudo isso é verdade, certamente bem acolhida para quem com este livro se estreou na obra de Dennis Lehane. Mas para quem já leu grandes livros deste escritor – também autor do guião da série televisiva ‘Boardwalk Empire’ – como ‘Um Copo Antes da Batalha’, ‘Mystic River’ ou ‘Shutter Island’, ou mesmo a monumental ‘biografia’ de Boston, traduzida para português como ‘Terra de Sonhos (’A Given Day’ no original norte-americano), fica a desilusão de perceber que há pouco de novo na estrutura ficional em relação a essas obras incontornáveis. Há mais Lua e menos Sol. Mas vale sempre a pena lê-lo porque é um autor brilhante. E pelos diálogos deliciosos.