Se exceptuarmos a invasão do Panamá com o intuito de retirar Noriega do poder, em 1989, e a primeira Guerra do Golfo, em 1991, casos em que as forças inimigas eram na verdade irrisórias, os Estados Unidos da América não ganham uma guerra convencional desde 1945. E isto apesar de serem, desde a queda do império soviético, a força militar dominante no mundo, talvez até aquela que é tecnologicamente mais dominante na história da humanidade.
Ao impasse na Coreia, à derrota no Vietname, à cobardia nos Balcãs, à humilhação na Somália, à incompetência no Iraque, à impotência na Síria e à irresponsabilidade na Líbia, soma-se agora a catástrofe no Afeganistão. No preciso momento em que escrevo estas linhas, a História confirma o seu tique repetitivo: Cabul é uma revisitação de Saigão, nos últimos e caóticos dias da presença militar americana.
Com a ordem de retirada das tropas, que já vem de Barak Obama (através da substituição de soldados por drones), que foi acelerada por Donald Trump e que está a ser concluída à pressa por Joe Biden, a
situação no terreno deteriorou-se loucamente e num ápice instalou-se o pânico, a
confusão e a deserção, de tal forma que assistimos agora a este triste fenómeno: vinte anos depois da intervenção militar ter sido iniciada, com o intuito de derrubar o regime talibã, o país vai voltar a ser governado por... Talibãs. Um regresso ao ponto zero.
Portanto, este confronto de duas décadas, que custou a vida a cerca de 70 mil civis, 3.500 soldados da coligação ocidental e 45 mil soldados afegãos (desconhece-se o número de Talibãs mortos, mas será sempre superior a 50 mil) não serviu rigorosamente para nada a não ser: matar pessoas à barda e enriquecer fabricantes e comerciantes de armas, com especial destaque para o suspeito do costume - o complexo industrial-militar americano.
Dá até a sensação que os Estados Unidos não fazem guerras com o propósito de as vencer, mas apenas com a intenção de ganhar dinheiro com elas, embora, para sermos objectivos, haverá também que assumir um facto inescapável: por um conjunto grande de razões que já articulei aqui, em 2017, e aqui, mais recentemente, os americanos são péssimos soldados. Ainda por cima, são comandados por péssimos generais, que são chefiados por políticos corruptos, que são comprados por corporações globalistas, cujo único valor é o lucro.
Assim sendo e dado o seu registo sofrível, o que se aconselha ao Pentágono é prudência. Pelo menos até ao próximo Pearl Harbour. Embora desconfie que, a acontecer esse ataque inimigo, a resposta americana não vá ser gloriosa como noutros tempos. A qualidade humana, tecnológica e industrial que permitiu a vitória nas frentes do Atlântico e do Pacífico há 80 anos atrás, já não existe na federação do Tio Sam. E os valores libertários pelos quais se bateram esses homens e essas mulheres também não. Muito pelo contrário.