Cai a noite.
Até a lua tem vergonha
Da luz.
Os reis deste planeta
Não são os mamíferos.
São os insectos.
Dou um peido.
O gato faz
Cara feia.
Tenho um grilo
Por companhia.
Não lhe sou ingrato.
Fornalhas Velhas:
Onde a vilania do mundo
Encontra um fim.
De repente a estrada
Acaba.
Alentejo.
Este pátio alentejano
Podia ser
Japonês.
Trevas.
Escrevo às escuras,
Cego da ortografia.
Quando o grilo se cala,
Quase consegues ouvir
A terra a rodar.
Pensas no amigo
Que pensou este pátio.
Experimentas a humildade.
É de tal forma profundo o silêncio
Que o gelo faz um barulho enorme
No scotch.
Chuva de estrelas.
Não são estrelas, são sub-partículas
De Deus.
Ladra um cão.
Passa um avião.
Consegues contar os barulhos.
O meu gato
Está a gostar mais destas férias
Do que eu.
Fizeste amizade com o grilo.
Agora aguenta-te
À bronca.
O ateu é um comensal que depois de lauta refeição
Continua convicto
Que o cozinheiro não existe.
Todo o candeeiro é um desafio
à vontade
de trevas.
Quando convives em constância com a dor
Ganhas uma relação nova
Com a morte.
Estou saturado do meu computador.
Mas a culpa
Não é dele.
Sempre gostei da minha profissão
Mas agora
Já não.
O grilo fala-me da realidade.
E eu
Desconverso.
O montado é um jardim
Tecido pelo labor do homem
E a boa vontade da Mãe Natureza.
Até o canavial não está psicologicamente preparado
Para a canícula
De Abril.
Morreu um amigo meu.
Mas as lágrimas que nesse dia chorei foram por causa
De um piloto de ralis.
O meu coração é mais duro
Que a terra
Que me segura.